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Dentre as superfícies sem bordo, distinguimos dois tipos: as orientáveis e as não-orientáveis. Enunciaremos o Teorema de Classificação separadamente nos dois casos.

 

Superfícies orientáveis

 

A Esfera, o Toro e o Bitoro foram exemplos dados. O Bitoro, como vimos no Capítulo XII, é a soma conexa de dois toros. Na verdade, pensando de um modo geral, se S0 é uma superfície orientável, sua soma conexa com o Toro também é orientável. Isso nos dá uma maneira de construir novas superfícies orientáveis pela soma conexa sucessiva de toros às supefícies já existentes. Assim geramos tritoros, quadritoros, etc. O Teorema de Classificação nos diz que essa é a única maneira de se produzir superfícies orientáveis sem bordo.

 

Teorema de Classificação para superfícies orientáveis sem bordo. Toda superfície orientável sem bordo é homeomorficamente equivalente a uma esfera ou à soma conexa sucessiva de n toros, para algum número natural n.

 

Antes de discutirmos a classificação das superfícies não-orientáveis, vejamos como fazer uso desse Teorema.

 

Como vimos no Capítulo XII, cada toro que somamos diminui em duas unidades a característica de Euler. A Esfera tem característica de Euler X igual a 2, o toro tem X=0, o bitoro tem X=-2, etc. A soma conexa de n toros tem

X = 2 - 2n .

 

Na verdade já discutimos esse assunto no Capítulo VII, mas lá em vez de somar toros falávamos em adição de alças. O número n é chamado de gênero da superfície. Convenciona-se que a Esfera tenha gênero zero.

 

Se nos é dada uma superfície qualquer, orientável e sem bordo, sabemos pelo Teorema que ela é homeomorficamente equivalente a uma esfera ou à soma conexa de n toros, para algum n maior ou igual a 1. Como saber quanto vale n?

 

Ora, basta calcular a característica de Euler da superfície. Se for igual a -8, por exemplo, significa que n = 5, pois

-8 = 2 - 2 · 5 .

 

O Teorema também nos informa que não existem superfícies orientáveis, sem bordo, com característica de Euler maior do que 2! E também que não existem superfícies desse tipo com característica de Euler igual a 1, -1, -3, -5, etc. Os únicos valores possíveis para a característica de Euler de superfícies orientáveis sem bordo são o 2 (esfera), o zero (toro), o -2 (bitoro), o -4 (tritoro), o -6 (quadritoro), etc.

 

De forma geral, podemos obter o gênero a partir da característica de Euler através da equação

n = 1 - X/2 ,

que é a equação X = 2 - 2n resolvida para n.

 

Para ilustrar um pouco mais, vejamos um exemplo em que o Teorema de Classificação é bastante útil.

 

Consideremos a superfície de Seifert do nó trifólio construída no Capítulo XI (de fato, obtivemos dois modelos diferentes, mas para os dois será igualmente válido o raciocínio). Chamemos de S0 essa superfície, que é orientável e tem uma componente de bordo. Colando um disco ao bordo teremos uma superfície orientável e sem bordo, a qual chamaremos de S.

 

No Capítulo VII vimos que a adição de tampas aumenta em uma unidade a característica de Euler. Portanto

X(S) = X(S0) + 1

Para calcular X(S0) temos que ver como S0 foi construída.

 

Não é difícil ver que ela é homeomorfa à seguinte superfície, definida via identificação. Os discos correspondem às regiões maiores da montagem e os retângulos às tiras que as ligam.

 

 

Na figura temos:

  • letras minúsculas para indicar as arestas a serem identificadas, num total de 6;
  • algarismos romanos indicando segmentos do bordo, num total de 12;
  • algarismos arábicos para contar os vértices, que são em número de 12.

 

Como há 5 faces, então a característica de Euler da superfície S0 é 5 - 18 + 12, isto é, -1. Em conseqüência, a característica de Euler da superfície S, que é S0 acrescida de uma tampa, é zero.

 

Então S é uma superfície orientável sem bordo com característica de Euler igual a zero. Pelo Teorema de Classificação, essa superfície é homeomorfa a um toro, e por conseguinte a superfície original S0 é um toro sem uma tampa!

 

Tudo bem, desde que acreditemos no Teorema! Mas... será que não tem um jeito direto de ver que essas superfícies de Seifert do nó trifólio são homeomorfas a um toro sem uma tampa?

 

Bom, tentemos..... No desenho abaixo temos um toro sem uma tampa. O bordo da tampa é dividido em 12 segmentos, que numeramos com algarismos romanos.

 

 

Nosso objetivo é recortar essa figura em 5 pedaços: três tiras e dois discos, cujas orientações de identificação sejam exatamente iguais àquelas da superfície de Seifert do nó trifólio. O recorte é feito baseado na figura seguinte.

 

 

As áreas sombreadas em tom mais forte correspondem às três tiras. O primeiro passo então é recortar a figura e compor essas três tiras.

 

 

Ficam para serem arranjados os pedaços restantes:

 

 

Colando segundo A', A'', A''' e B', B'', B''', obtemos os dois discos restantes:

 

 

Ufa! Funcionou! De qualquer forma, tivemos que contar com o Teorema para saber por onde começar!

 

Para quem achou isso muito complicado, um consolo: no próximo Capítulo teremos formas menos intrincadas de descobrir com que superfície estamos lidando!

 

 
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