O que é Cálculo?
Cálculo é uma pequena pedra. Médicos ainda usam a palavra cálculo com
esse sentido, para descrever sua presença nos rins, por exemplo. Jogar
com pequenas pedras, ou "calcular" é uma forma primitiva de
aritmética.
O Cálculo Diferencial e Integral é uma parte importante da Matemática,
diferente de tudo o que o aluno ingressante na Universidade já estudou
até aqui: ele é dinâmico. Trata da variação, de movimento e de
quantidades que mudam, tendendo a outras quantidades.
As primeiras idéias do Cálculo surgiram na Grécia antiga, há 2500
anos atrás. Naquela época os gregos já sabiam calcular a área de
qualquer região poligonal, dividindo-a em triângulos e somando as áreas
obtidas. Para o cálculo de áreas de regiões planas limitadas por curvas,
eles usavam o chamado Método da Exaustão. Esse método consistia
em considerar polígonos inscritos e circunscritos à região. Aumentando o
número de lados dos polígonos, eles conseguiam chegar a valores bem
próximos do valor real da área. Por exemplo, suponha que quiséssemos
calcular a área A de um círculo. Representando por
An a área do polígono regular de n lados,
incrito no círculo e por Bn a área do polígono circunscrito de
n lados, vemos que, para cada valor de n, tem-se
An < A < Bn
À medida em que o número de lados dos polígonos aumenta, a área
An fica cada vez maior, a área
Bn, cada vez menor, e ambas mais próximas do valor
da área do círculo.
Na linguagem atual dizemos "a área do círculo é o limite das áreas
dos polígonos regulares a ele inscritos, quando n tende a
infinito" (e também é igual ao limite das áreas dos polígonos
circunscritos). Escrevemos
A = lim An = lim Bn
Arquimedes é considerado o maior dos Matemáticos da antigüidade e um dos
três maiores de todos os tempos. Ele vivia na cidade de Siracusa, sul da
Itália.
O livro de Carl Boyer sobre História da Matemática nos conta:
"Conhece-se poucos fatos da vida de Arquimedes, mas tem-se alguma
informação indireta através da narração de Plutarco sobre o general
romano Marcelo.
Durante a segunda guerra Púnica, a cidade de Siracusa foi
sitiada pelos romanos. Arquimedes inventou engenhosas máquinas de guerra
para manter o inimigo à distância: catapultas para lançar pedras,
cordas, polias e ganchos para levantar e espatifar navios romanos,
invenções para queimar os navios. Entretanto, Siracusa caiu e, durante o
saque da cidade, Arquimedes foi morto por um soldado romano, apesar das
ordens de Marcelo para que o geômetra fosse poupado...
Diz-se que Marcelo reservou para si engenhosos planetários que
Arquimedes tinha construído para retratar os movimentos dos corpos
celestes. Todas as narrações da vida de Arquimedes, no entanto, nos
contam que ele dava pouco valor para seus engenhos mecânicos, em
comparação com o produto de seus pensamentos. Mesmo quando lidava com
alavancas e outras máquinas simples, ele estava muito mais interessado
em princípios gerais do que em aplicações práticas."
Os tratados escritos por Arquimedes são extremamente precisos do ponto
de vista da lógica. Também tinha idéias bastante avançadas para o seu
tempo. Alguns de seus métodos só foram retomados 2000 anos depois. Ele
fez uma significativa contribuição ao Cálculo ao achar a área da
região limitada por uma parábola e uma reta, fazendo a soma das áreas de
infinitos triângulos. Foi a primeira vez que se calculou soma com
infinitos termos.
Usaremos uma idéia parecida com essa em MAT-111 para
encontrar a área de regiões limitadas por gráficos de funções e retas
paralelas aos eixos coordenados. Esta parte do curso é o que chamamos de
Cálculo Integral e que só foi estudada de forma definitiva no final do
século 17.
No século XVII viveu o jurista francês Pierre de Fermat (1601 - 1665),
um jurista francês que se dedicava ao estudo de Matemática nas horas
vagas. Com os instrumentos da Geometria Analítica que ele mesmo
desenvolveu (antes mesmo de René Descartes), Fermat estudou funções,
tendo encontrado um método de determinar máximos e mínimos de funções
analisando os pontos do gráfico em que a reta tangente é horizontal.
As idéias de Fermat foram depois ampliadas e aprofundadas pelos ingleses
John Wallis (1616 - 1703), Isaac Barrow (1630 - 1677) e Isaac Newton
(1642 - 1727) e pelo alemão Gottfried Leibniz (1646 - 1716).
O próximo passo importante para o desenvolvimento do Cálculo foi dado
por Barrow que criou um método de achar a reta tangente ao gráfico de
uma função em um ponto P. Tendo as coordenadas do ponto
P, era necessário achar apenas qual o coeficiente angular
(inclinação) da reta tangente. Mas como?
Tomando-se outro ponto Q sobre o gráfico, calcula-se a
inclinação mPQ da reta PQ, que é secante ao
gráfico. Depois aproxima-se o ponto Q do ponto P. Com
isso, a inclinação da reta secante aproxima-se da inclinação m
da reta tangente. Novamente aqui aparece a noção de limite: a
inclinação da reta tangente é o limite das inclinações das infinitas
retas secantes PQ, quando Q tende a P.
Escrevemos
m = lim mPQ
Veja uma animação que ilustra essa idéia em
http://www.ima.umn.edu/~arnold/calculus/secants/secants2/secants-g.html
A parte do Cálculo que lida com retas tangentes, velocidade instantânea,
problemas de otimização, etc... é conhecido como Cálculo
Diferencial. Newton (mais um dos três grandes gênios da Matemática)
provou o que hoje é chamado de Teorema Fundamental do Cálculo,
que estabelece a relação entre o Cálculo Diferencial e o Cálculo Integral.
Note que em cada um dos problemas acima mencionados, o cálculo de uma
quantidade é feito como limite de outras quantidades mais fáceis de
calcular. É essa a idéia básica que permeia o Curso de Cálculo
Diferencial e Integral. Entretanto, os matemáticos antigos lidaram com
essa idéia de aproximações e limites de modo intuitivo por dois
séculos. Percebiam a falta do mesmo nível do rigor ensinado pelos
gregos antigos para poderem justificar formalmente os procedimentos, e
até mesmo evitar contradições e erros que fizeram. Mas a humanidade
precisou esperar até o século 19 para que este rigor fosse finalmente
encontrado por Augustin-Louis Cauchy (1789 - 1857), que criou uma
definição formal de limite. Essa demora de 2 séculos sinaliza a
dificuldade de compreensão desse conceito, mas que é a ferramenta básica e
indispensável de todo Matemático nos dias de hoje.
O Cálculo Diferencial e Integral nasceu motivado por alguns poucos
problemas, mas a abstração e a sofisticação das idéias que a partir dali
foram sendo desenvolvidas fez com que ele se tornasse hoje um assunto
fundamental, com aplicações não só em Matemática, mas também em Física,
Química, Estatística, Economia, e muitas outras áreas do
conhecimento. O Cálculo Diferencial e Integral é usado na determinação
de órbitas de astros, satélites, mísseis; na análise de crescimento de
populações (de humanos, bactérias, ou outra qualquer); em medidas de fluxos
(fluxo sangüíneo na saída do coração, fluxo de carros nas estradas,
fluxo da água nos canos, etc...); em importantes problemas de
otimização, tais como achar as quantidades ideais de produção que
minimizam custos, quais as que maximizam lucros; determinar qual a
melhor maneira de empilhar pacotes sob certas condições, como construir
reservatórios com máxima capacidade e custo fixado, como achar o melhor
caminho de modo a minimizar o tempo de percurso, qual o melhor lugar
ângulo para se construir um teto com certas características, etc...
Por esse motivo, o Cálculo Diferencial e Integral é hoje considerado um
instrumento indispensável de pensamento em quase todos os campos da
ciência pura e aplicada: em Física, Química, Biologia, Astronomia,
Engenharia, Economia e até mesmo em algumas Ciências Sociais, além de
áreas da própria Matemática. Os métodos e as aplicações do Cálculo estão
entre as maiores realizações intelectuais da civilização, uma conquista
cultural e social, e não apenas científica.
Esperamos que vocês aprendam com interesse e prazer as idéias descritas. Leiam os
livros recomendados e divirtam-se!
Last modified: Mon Mar 1 17:10:28 BRT 2004
Martha Salerno Monteiro