Como lidar com risco e retorno

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Como lidar com risco e retorno

Professor do Instituto de Matemática, que desenvolveu um programa de computador para orientar os aplicadores, analisa a crise mundial e diz que o mercado brasileiro é promissor

YEDA S. SANTOS



O binámio risco-retorno faz parte da rotina de quem investe em bolsas de valores, em proporções previsíveis: quanto maior o risco, maior o retorno provável. Os grandes riscos estão implícitos nos grandes retornos e vice-versa. Isso não quer dizer que se vê ganhar muito dinheiro; quer dizer que se poderá ganhar. Se o retorno fosse certo, não haveria risco. Nem aplicação em bolsa. “Aquele que não almeja bons lucros deve colocar o dinheiro em caderneta de poupança e conformar-se com o retorno medíocre (em torno de 1% ao mês) ou deixar o dinheiro embaixo do colchão”, afirma o professor Julio Stern, do Instituto de Matemática e Estatística (IME) e diretor do Centro de Matemática e Computação Aplicada da USP.

A vontade, ou coragem, de aplicar muito dinheiro, correr altos riscos na expectativa de polpudos ganhos define, segundo ele, o perfil psicológico de uma pessoa. Stern divide em duas categorias os investidores: fóbico, aquele que tem pavor de assumir qualquer risco; e arrojado, o outro. O primeiro é o investidor em caderneta de poupança. Naturalmente tal perfil só faz sentido quando o problema não é a falta de dinheiro para investir.

Apoiado nesse binómio, Stern desenvolveu um software chamado Ponto Crítico, lançado em 1993, que vem sendo aperfeiçoado ano a ano, e orienta os negócios de grandes instituições financeiras que aplicam em bolsas. Há três anos, o programa foi adotado por instituições associadas à Bolsa Mercantil & de Futuros (BM&F) que financiou o projeto desenvolvido na USP.

Ponto Crítico detecta a real situação do título no qual se quer investir e é tido como um sistema de controle de riscos. “A aplicação em bolsa tem que ser administrada com racionalidade, a partir de uma fronteira eficiente de ativos onde a primeira medida é administrar os riscos”, ensina Stern. O software desenvolvido mostra o mercado e suas possibilidades. Um apito toca toda vez que existe risco de o investidor perder mais do que a instituição é capaz de suportar. “A instituição, nesse momento, deve tomar medidas corretivas que reposicionem a carteira dentro de uma margem de risco aceitável”, explica.

Cada instituição financeira, quando monta uma carteira, estabelece o tamanho máximo de seu prejuízo e o investidor deve consultar um especialista em bolsa para investir bem. Terá, nesse caso, orientação sobre como diversificar seus investimentos, partindo de análise que produza resultado ótimo com risco mínimo. Poderá, ao contrário, agir por conta própria e não se sair muito bem. “é o mesmo que automedicar-se. Pode dar certo ou não”, avalia Stern. Ele ainda acrescenta: “O investidor quer menor risco e maior retorno, o que se pode conseguir através da análise da fronteira eficiente, para detectar qual é, dentre todas, a carteira que oferece as melhores condições de risco e retorno. Na fronteira eficiente também está a carteira viável (possível), caracterizada por um risco e um retorno quaisquer”. O software Ponto Crítico foi criado para prever a margem de segurança de cada investidor, em cada situação.

Controla-se a carteira otimizando o mercado, através do programa que permite aos investidores um sistema de otimização que os ajuda a tomar decisões acertadas, sempre analisando a carteira a partir das variáveis risco e retorno.

Stern informa que sistemas como o Ponto Crítico, já completamente assimilados pelo mercado brasileiro, são usados em países desenvolvidos. “Antes de existir no Brasil, a intuição, sem análise quantitativa precisa, era a arma mais utilizada”, lembra.

Queda contaminante

As bolsas caem e contaminam tudo. Quando uma bolsa cai, tira-se dinheiro de outra, que ainda não caiu, para tentar realizar o lucro. “A bolsa caiu em Hong Kong e nós caímos também porque há grandes fundos que investem na China e aqui. No momento em que parte dos ativos que estão na China caíram, esses fundos precisaram vender outros ativos líquidos que estão bem valorizados para cobrir o rombo.”

Para resolver a crise, o governo brasileiro aumentou as taxas de juros e possibilitou que grande parte do capital ficasse aqui mesmo para aproveitar esse aumento. “O aumento das taxas de juros deve ser algo transitório, embora não chegue aos níveis de antes da crise”, acredita.

Porém, se analisadas de outubro de 1996 a outubro de 97, as bolsas, no Brasil, tiveram um ganho de 102% a 105%. “Foi um excelente retorno, mas não existe retorno sem risco”, repete Stern.

Ele acha que a estabilidade nas bolsas de valores deveu-se aos acertos na economia do País, no que se refere à manutenção de uma moeda forte e uma política monetária, cambial e de juros que faz sentido. Na recente queda das bolsas, entre 27 e 31/10, em todo o mundo, o Ponto Crético não impediu a perda de cerca de 30% nos preços dos papéis, no Brasil. Mesmo identificada por “tombinho”, em relação aos ganhos, por Stern, tal queda deve ser olhada com seriedade, pois sinaliza que passou da hora de fazer as reformas fiscais e administrativas. “É preciso zerar o déficit do governo e elaborar um sistema fiscal que permita ao setor produtivo crescer. Ou se faz isso ou nos preparamos para o pior. Sem reformas, para dar sustentação ao Plano Real, a política econômica corre o risco de derrapar”, diz.

Para Stern, caso as reformas já tivessem sido feitas, a queda das bolsas não teria causado o efeito que causou. Teríamos tido uma flutuarão sem muita profundidade. Na sua opinião, é preciso olhar a queda das bolsas de valores, em todo o mundo, como um processo de globalização em andamento e, também, como um termómetro. As pessoas responsabilizam as bolsas por perdas que não são provocadas por elas. “Se comparadas a um automóvel, as bolsas seriam o velocímetro, enquanto os desacertos na economia deveriam ser creditados ao motor do veículo que, nesse caso, representa o setor produtivo.”

Numa economia típica, apenas 5% da riqueza são aplicados em bolsas. O restante é investimento direto. Portanto, elas são o resultado do desempenho do setor produtivo. Stern cita Keynes, um dos clássicos da economia, para assinalar: “Um presidente deve tomar decisões importantes nos dois primeiros anos de governo, que é quando tem força política para implementar reformas. Nos últimos dois anos está em campanha eleitoral e não tem mais força para isso”. Na sua opinião, esse governo perdeu a oportunidade de fazer reformas. Porém, se a situação como está durar mais dois anos, as perspectivas são as piores.

“O povo brasileiro demorou dez anos para sair da última crise e chegou a uma bifurcação: podemos continuar rumo à modernidade, à integração das economias de mercado, buscando eficiência da nossa economia, ou podemos ir para o buraco de novo. Ou continuamos trabalhando e melhorando ou rolamos ladeira abaixo”, sintetiza.

Carteira e portfolio são sinônimos. Significam a divisão da riqueza da empresa em várias oportunidades de investimentos. Ativo é o papel negociado em bolsa. As aplicações se fazem através de corretoras de investimentos e os investidores podem ser individuais ou empresas, desde que tenham uma carteira, ou ativo.

O mercado agrícola brasileiro é extremamente promissor. Potencialmente, é um dos mais produtivos do mundo, embora sofra com a falta crítica de capital e com a interferência do governo através das políticas de preço mínimo e controles reguladores de estoques.

“Seria bom que o governo saísse da microgestão desses programas agrícolas e permitisse que tais riscos fossem regulados pelo próprio mercado”, diz Stern. “O sinal de quanto é saudável o mercado agrícola está em quo ativas são suas opções de futuro sobre commodities agrícolas.” Entre os principais produtos comercializados pelas opções de futuro do mercado agrícola brasileiro, estão boi gordo, soja, café, milho. O professor Julio Stern salienta que o desempenho do nosso mercado agrícola contribuiu para que a BM&F passasse de uma pequena bolsa, há dez anos, para a quarta ou quinta do mundo.