-- Iiiih... 
  -- E agora? 
  -- Vamos ter que conversar. 
  -- Vamos ter que o quê? 
  -- Conversar. É quando um fala com o outro. 
  -- Fala o quê? 
  -- Qualquer coisa. Bobagem. 
  -- Perder tempo com bobagem? 
  -- E a televisão, o que é? 
  -- Sim, mas aí é a bobagem dos outros. A gente só assiste. 
  Um falar com o outro, assim, ao vivo... Sei não... 
  -- Vamos ter que improvisar nossa própria bobagem. 
  -- Então começa você. 
  -- Gostei do seu cabelo assim. 
  -- Ele está assim há meses, Eduardo. Você é que não 
  tinha... 
  -- Geraldo. 
  -- Hein? 
  -- Geraldo. Meu nome não é Eduardo, é Geraldo. 
  -- Desde quando? 
  -- Desde o batismo. 
  -- Espera um pouquinho. O homem com quem eu casei se chamava Eduardo. 
  -- Eu me chamo Geraldo, Maria Ester. 
  -- Geraldo Maria Ester?! 
  -- Não, só Geraldo. Maria Ester é o seu nome. 
  -- Não é não. 
  -- Como, não é não? 
  -- Meu nome é Valdusa. 
  -- Você enlouqueceu, Maria Ester? 
  -- Pelo amor de Deus, Eduardo... 
  -- Geraldo. 
  -- Pelo amor de Deus, meu nome sempre foi Valdusa. Dusinha, você não 
  se lembra? 
  -- Eu nunca conheci nenhuma Valdusa. Como é que eu posso estar casado 
  com uma mulher que eu nunca... Espera. Valdusa. Não era a mulher do, 
  do... Um de bigode...
  -- Eduardo. 
  -- Eduardo! 
  -- Exatamente. Eduardo. Você. 
  -- Meu nome é Geraldo, Maria Ester. 
  -- Valdusa. E, pensando bem, que fim levou o seu bigode? 
  -- Eu nunca usei bigode! 
  -- Você é que está querendo me enlouquecer, Eduardo. 
  -- Calma. Vamos com calma. 
  -- Se isso for alguma brincadeira sua... 
  -- Um de nós está maluco. Isso é certo. 
  -- Vamos recapitular. Quando foi que casamos? 
  -- Foi no dia, no dia... 
  -- Arrá! Tá aí. Você sempre esqueceu o dia do nosso 
  casamento... Prova de que você é o Eduardo e a maluca não 
  sou eu. 
  -- E o bigode? Como é que você explica o bigode? 
  -- Fácil. Você raspou. 
  -- Eu nunca tive bigode, Maria Ester! 
  -- Valdusa! 
  -- Tá bom. Calma. Vamos tentar ser racionais. Digamos que o seu nome seja 
  mesmo Valdusa. Você conhece alguma Maria Ester?
  -- Deixa eu pensar. Maria Ester... Nós não tivemos uma vizinha 
  chamada Maria Ester? 
  -- A única vizinha de que eu me lembro é a tal de Valdusa. 
  -- Maria Ester. Claro. Agora me lembrei. E o nome do marido dela era... Jesus! 
  
  -- O marido se chamava Jesus? 
  -- Não. O marido se chamava Geraldo. 
  -- Geraldo... 
  -- É. 
  -- Era eu. Ainda sou eu. 
  -- Parece... 
  -- Como foi que isso aconteceu? 
  -- As casas geminadas, lembra? 
  -- A rotina de todos os dias... 
  -- Marido chega em casa cansado, marido e mulher mal se olham... 
  -- Um dia marido cansado erra de porta, mulher nem nota... 
  -- Há quanto tempo vocês se mudaram daqui? 
  -- Nós nunca nos mudamos. Você e o Eduardo é que se mudaram. 
  
  -- Eu e o Eduardo, não. A Maria Ester e o Eduardo. 
  -- É mesmo... 
  -- Será que eles já se deram conta? 
  -- Só se a televisão deles também quebrou. 
Colaborou: Nelson Guedes Paulo Junior