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MAT–2453: Soluções de Exercícios das Provas

Seção 2.1 Primeira Prova

Exercícios Exercícios

1.

Seja \(f\colon\R\to\R\) dada por
\begin{equation*} f(x)= \begin{cases} \hfill (x-\sin x)\sin\big(\frac{1}{x}\big)&, \text{ se } x<0;\\ \hfill (x^2-x)\ln(x+1)&, \text { se } 0\leq x<1;\\ \hfill -1+\sqrt{x}&, \text { se } x\geq 1. \end{cases} \end{equation*}
  1. A função \(f\) é contínua em \(p=0\text{?}\) É derivável em \(p=0\text{?}\)
  2. A função \(f\) é contínua em \(p=1\text{?}\) É derivável em \(p=1\text{?}\)
Justifique suas respostas para os dois itens acima.
Solução.
Observamos inicialmente que para uma função \(f\) ser contínua num ponto \(x=p\) (que deve estar em seu domínio), basta verificar que \(\lim\limits_{x\to p}f(x)=f(p)\text{.}\) Além disso, \(\lim\limits_{x\to p}f(x)=L\in\R\iff \lim\limits_{x\to p^+}f(x)=\lim\limits_{x\to p-}f(x)=L\text{.}\)
Para que uma função \(f\) seja derivável em \(x=p\text{,}\) o limite \(\lim\limits_{x\to p}\dfrac{f(x)-f(p)}{x-p}\) deve existir e ser um número real. Sabemos que isso garante a continuidade de \(f\) em \(x=p\) (não vale a recíproca disso!). Também podemos testar a diferenciabilidade de \(f\) em \(x=p\) com o limite \(\lim\limits_{h\to 0}\dfrac{f(p+h)-f(p)}{h}\text{.}\)
Vamos testar essas duas condições em cada um dos pontos indicados no enunciado:
  • \(p=0\text{:}\) observamos inicialmente \(f(0)=(0^2-0)\ln(0+1)=0\) e, como \(f\) é definida por múltiplas sentenças, então
    \begin{align*} \lim\limits_{x\to 0^-}f(x)&=\lim\limits_{x\to 0^-}(x-\sin x)\sin\big(\frac{1}{x}\big)=0\text{ e}\\ \lim\limits_{x\to 0^+}f(x)&=\lim\limits_{x\to 0^+}(x^2-x)\ln(x+1)=0, \end{align*}
    pois no primeiro limite \(x-\sin x\) tende a \(0\) e \(\sin\big(\frac{1}{x}\big)\) é limitado (entre \(-1\) e \(1\)). No segundo limite temos que ambos fatores tendem a \(0\text{,}\) pois são dados por funções contínuas, quando o valor do limite é o valor da função no ponto.
    Com isso, temos que \(\lim\limits_{x\to 0^-}f(x)=\lim\limits_{x\to 0^+}f(x)=0\) e portanto \(\lim\limits_{x\to 0}f(x)=0=f(0)\text{,}\) mostrando que \(f\) é contínua em \(p=0\text{.}\)
    Para decidir se \(f\) é derivável em \(p=0\text{,}\) consideramos o limite
    \begin{equation*} \lim\limits_{x\to 0}\dfrac{f(x)-f(0)}{x-0}, \end{equation*}
    para o qual também precisamos analisar os laterais:
    \begin{align*} \lim\limits_{x\to 0^-}\dfrac{f(x)-f(0)}{x-0}& =\lim\limits_{x\to 0^-}\dfrac{(x-\sin x)\sin\big(\frac{1}{x}\big)}{x}\\ &=\lim\limits_{x\to 0^-}\big(1-\dfrac{\sin x}{x}\big)\sin\big(\frac{1}{x}\big) =0\text{ e}\\ \lim\limits_{x\to 0^+}\dfrac{f(x)-f(0)}{x-0}& =\lim\limits_{x\to 0^+}\dfrac{(x^2-x)\ln(x+1)}{x}\\ &=\lim\limits_{x\to 0^+}(x-1)\ln(x+1)=0, \end{align*}
    pois no primeiro limite o fator \(1-\dfrac{\sin x}{x}\) tende a \(0\) (limite trigonométrico fundamental) e, como antes, \(\sin\big(\frac{1}{x}\big)\) é limitado. No segundo limite os dois fatores são dados por funções contínuas em \(p=0\text{,}\) valendo \(-1\) e \(0\text{,}\) respectivamente. Assim, \(\lim\limits_{x\to 0}\dfrac{f(x)-f(0)}{x-0}=0\text{,}\) ou seja, \(f\) é derivável em \(p=0\) e \(f'(0)=0\text{.}\)
  • \(p=1\text{:}\) Procendendo de maneira análoga ao item anterior, agora com \(f(1)=-1+\sqrt{1}=0\text{,}\) temos:
    \begin{align*} \lim\limits_{x\to 1^-}f(x)&=\lim\limits_{x\to 1^-}(x^2-x)\ln(x+1)=0\text{ e}\\ \lim\limits_{x\to 1^+}f(x)&=\lim\limits_{x\to 1^+}-1+\sqrt{x}=0, \end{align*}
    pois todas as funções envolvidas são contínuas em \(p=1\text{.}\) Com isso, \(\lim\limits_{x\to 1}f(x)=0=f(1)\text{,}\) mostranto que \(f\) é contínua em \(p=1\text{.}\)
    Quanto à diferenciabilidade em \(p=1\text{,}\) precisamos considerar o limite
    \begin{equation*} \lim\limits_{x\to 1}\dfrac{f(x)-f(1)}{x-1}, \end{equation*}
    que também requer a análise dos limites laterais:
    \begin{align*} \lim\limits_{x\to 1^-}\dfrac{f(x)-f(1)}{x-1}& =\lim\limits_{x\to 1^-}\dfrac{(x^2-x)\ln(x+1)}{x-1}\\ &=\lim\limits_{x\to 1^-}x\ln(x+1)=\ln 2\text{ e}\\ \lim\limits_{x\to 1^+}\dfrac{f(x)-f(1)}{x-1}& =\lim\limits_{x\to 1^+}\dfrac{-1+\sqrt{x}}{x-1}=\\ &=\lim\limits_{x\to 1^+}\dfrac{1}{1+\sqrt{x}}=\dfrac{1}{2}, \end{align*}
    onde no primeiro limite a função resultante é contínua ("só substituir") e na segunda multiplicamos e dividimos a expressão original por \(1+\sqrt{x}\) para "eliminar a indeterminação".
Veja os gráficos de \(f\) (em azul) e \(f'\) (em vermelho), bem como uma versão aproximada do gráfico de \(f\) em torno dos pontos indicados no exercício:
described in detail following the image
Os gráficos de \(f\) e \(f'\)
Figura 2.1.1. Os gráficos de \(f\) e \(f'\text{.}\)

2.

Esta questão consiste de dois itens completamente independentes:
  1. Calcule \(\lim\limits_{x\to-\infty}x+\sqrt{x^2-3x}\text{.}\)
  2. Um triângulo retângulo tem como vértices os pontos \(A=(0,0)\text{;}\) \(B=(x,y)\text{,}\) no primeiro quadrante e sobre a circunferência \(x^2+y^2=1\) e \(C=(x,0)\text{,}\) que é a projeção de \(B\) sobre o eixo \(Ox\text{.}\) Seja \(\theta\) a medida do ângulo \(B\hat{A}C\text{.}\)
    Figura 2.1.2.
    1. Escreva área de \(\triangle ABC\) em função de \(\theta\text{.}\)
    2. Sabendo-se que, no instante em que \(\theta=\pi/6\text{,}\) a área do triângulo varia \(2\) unidades de área por segundo, determine taxa de variação do ângulo \(\theta\) nesse instante.
Solução.
Itens independentes, soluções independentes:
  1. Temos aqui uma indeterminação do tipo "\(-\infty+\infty\)". Vamos transformá-la numa do tipo "\(\dfrac{\infty}{\infty}\)":
    \begin{align*} \lim\limits_{x\to-\infty}x+\sqrt{x^2-3x}& =\lim\limits_{x\to-\infty}x+\sqrt{x^2-3x} \dfrac{x-\sqrt{x^2-3x}}{x-\sqrt{x^2-3x}}\\ &=\lim\limits_{x\to-\infty}\dfrac{x^2-x^2+3x}{x-\sqrt{x^2-3x}}\\ &=\lim\limits_{x\to-\infty}\dfrac{3x}{x-|x|\sqrt{1-3/x}}\\ &=\lim\limits_{x\to-\infty}\dfrac{3x}{x\big(1+\sqrt{1-3/x}\big)}\\ &=\lim\limits_{x\to-\infty}\dfrac{3}{1+\sqrt{1-3/x}}=\dfrac{3}{2}, \end{align*}
    pois, como \(x\to-\infty\text{,}\) podemos assumir \(x<0\) e então \(|x|=-x\) e também, nessas condições, temos \(3/x\to 0\text{.}\)
    1. Da maneira como \(\triangle ABC\) é construído temos que \(\overline{AC}=\cos\theta\) e \(\overline{BC}=\sin\theta\) e então
      \begin{equation*} A(\theta)=\dfrac{\cos\theta\cdot\sin\theta}{2}. \end{equation*}
    2. Como a área varia em função do tempo, temos bem definida a função \(t\mapsto A(t)\text{,}\) que induz a função \(t\mapsto \theta(t)\text{.}\) Desta forma, temos
      \begin{equation*} A(t)=\dfrac{\cos\theta(t)\cdot\sin\theta(t)}{2}. \end{equation*}
      Derivando em relação a \(t\text{,}\) temos
      \begin{equation*} A'(t)=\dfrac{\cos^2\big(\theta(t)\big)-\sin^2\big(\theta(t)\big)}{2} \cdot\theta'(t). \end{equation*}
      No instante \(t_0\) em que \(\theta(t_0)=\pi/6\text{,}\) temos
      \begin{equation*} A'(t_0)=2, \cos^2\big(\theta(t_0)\big)=3/4, \sin^2\big(\theta(t_0)\big)=1/4 \end{equation*}
      que aplicados na igualdade acima dá
      \begin{equation*} 2=\dfrac{3/4-1/4}{2}\cdot\theta'(t_0)\implies \theta'(t_0)=8\text{rad/s}. \end{equation*}

3.

Seja \(f\colon ]0,+\infty[\to\R\) dada por \(f(x)=e^{\frac{3}{x}}\text{.}\)
  1. Mostre que \(f\) é (estritamente) decrescente e calcule \(\lim\limits_{x\to 0^+}f(x)\text{,}\) bem como \(\lim\limits_{x\to+\infty}f(x)\text{.}\)
  2. Determine a equação da reta tangente ao gráfico de \(f\) no ponto \(\big(p,f(p)\big)\text{.}\)
  3. Considere o triângulo retângulo formado pelos semi-eixos positivos e a reta tangente ao gráfico de \(f\) no ponto \(\big(p,f(p)\big)\text{.}\) Escreva, em função de \(p\text{,}\) a área desse triângulo.
  4. Determine \(p>0\) para que essa seja a menor área possível.
Solução.
  1. Como \(f\) é derivável em todos os pontos do seu domínio, que é um intervalo aberto, podemos estudar seu crescimento através do sinal da primeira deivada:
    \begin{equation*} f'(x)=\dfrac{-3e^{3/x}}{x^2}<0, \text{ para todo }x\in]0,+\infty[, \end{equation*}
    garantindo que \(f\) é decrescente em todo o seu domínio.
    Aos limites:
    • \(\lim\limits_{x\to 0^+}f(x)=\lim\limits_{x\to 0^+}e^{3/x}=e^{\lim\limits_{x\to\;0^+}\frac{3}{x}}=+\infty\text{,}\) pois a função exponencial é contínua, \(\lim\limits_{x\to 0^+}\dfrac{3}{x}=+\infty\) e \(\lim\limits_{y\to+\infty}e^y=+\infty\text{.}\)
    • Notando que \(\lim\limits_{x\to+\infty}\dfrac{3}{x}=0\text{,}\) com os mesmos argumentos utilizados acima, temos \(\lim\limits_{x\to +\infty}f(x)=\lim\limits_{x\to +\infty}e^{3/x}=e^{\lim\limits_{x\to\;+\infty}\frac{3}{x}}=e^0=1\text{.}\)
  2. Em geral, a equação da reta tangente ao gráfico de uma função derivável no ponto \(\big(p,f(p)\big)\) é
    \begin{equation*} y=f(p)+f'(p)(x-p). \end{equation*}
    Neste caso temos \(f(p)=e^{3/p}\) e \(f'(p)=\dfrac{3e^{3/p}}{p^2}\text{.}\) Assim, a equação da reta tangente pedida é
    \begin{equation*} y=e^{3/p}-\frac{3e^{3/p}}{p^2}(x-p)\implies y= -\dfrac{3e^{3/p}}{p^2}x+\frac{e^{3/p}}{p}(p+3). \end{equation*}
  3. O triângulo descrito tem como vértices a origem e os interceptos da reta obtida acima com os eixos coordenados. Vamos determinar tais interceptos:
    • \(x=0\text{:}\) \(y=\frac{e^{3/p}}{p}(p+3)\)
    • \(y=0\text{:}\) \(x=\frac{p}{3}(p+3)\)
    A área do triângulo, para cada \(p>0\text{,}\) é
    \begin{equation*} A(p)=\frac{1}{2}\cdot\frac{e^{3/p}}{p}(p+3)\cdot \frac{p}{3}(p+3)=\frac{(p+3)^2e^{3/p}}{6}. \end{equation*}
  4. Como a função área está definida no intervalo aberto \(]0,+\infty[\text{,}\) os candidatos a ponto de mínimo, são aqueles onde \(A'(p)=0\text{.}\) A derivada de \(A(p)\) é
    \begin{equation*} A'(p)=\frac{(p+3)}{3}e^{3/p}-\frac{(p+3)^2}{2p^2}e^{3/p}= \frac{e^{3/p}(p+3)}{6p^2}\big(2p^2-3(p+3)\big) \end{equation*}
    Então
    \begin{equation*} A'(p)=0\iff 2p^2-3p-9=0\iff p=3. \end{equation*}
    Observamos que, para \(0< p< 3\text{,}\) temos \(A'(p)< 0\) (\(A\) é decrescente nesse intervalo), e para \(p> 3\text{,}\) vale que \(A'(p)> 0\) (\(A\) é crescente nesse intervalo). Logo \(p=3\) é ponto de mínimo global da área.
    A título de curiosidade a área mínima é \(A(3)=6e\text{.}\)
    Ainda não temos todas as ferramentas para construir o gráficos das funções que aparecem aqui, mas aqui estão:
    described in detail following the image
    Os gráficos de \(f\) e \(f'\)
    Figura 2.1.3. Os gráficos de \(f\text{,}\) \(A\) \(A'\text{,}\) além do triângulo de área mínima.