As aulas de 23/04/99 e de 27/04/99 foram dedicadas a comentários sobre o
primeiro capítulo do livro "Information
Rules", de Shapiro e Varian (1998), leitura previamente solicitada aos
alunos do curso.
Avisos da aula de 27/04/99
1) A primeira prova do curso será aplicada em 30/04/99
(sexta-feira). Objetivando evitar ao máximo a necessidade de prova
subtitutiva, aconselha-se aos alunos que optaram por fazer as provas ao
invés do Projeto Prático que não faltem.
2) A aula de 04/05/99 (terça-feira) será diferente: haverá projeção do
programa Roda Viva com entrevista do sociólogo italiano Domenico de
Masi. Na aula seguinte (07/05/99 - sexta-feira) será feita a discussão
sobre o assunto. Leia o artigo relacionado do jornal "O
Estado de São Paulo".
3) Em 06/05/99 (quinta-feira), às 14:00, o professor alemão Martin Grötschel
ministrará uma palestra, falando em inglês sobre a União Internacional da
Matemática e de suas idéias de disponibilizar na rede toda uma biblioteca
de conteúdo da Matemática (assunto de interesse para este curso). As
tranparências que serão utilizadas podem ser obtidas
aqui. Local:
anfiteatro Jacy Monteiro - piso térreo do bloco B do IME.
Introdução
"Information Rules" é um livro que fez e ainda faz muito sucesso,
principalmente na área de economia, tendo como objetivo básico o de tentar
obter explicação para os acontecimentos de hoje em dia, esse redemoinho de
fatos conectados à informação em que nos encontramos. Dos livros sobre o assunto, esse parece ser o
mais amplo. Rico em idéias e pontos de vista de dois economistas, torna-se
leitura obrigatória para quem quer entender e acompanhar a enorme sucessão de
eventos que se observa todos os dias, devido a sua descrição da
economia.
Tão importante quanto ler o livro é refletir e discutir sobre seu conteúdo:
será que os pontos de vista dos autores continuarão válidos daqui a cinqüenta
anos? A leitura do livro na íntegra foge ao escopo do curso. Assim,
limitar-nos-emos ao primeiro capítulo, que na verdade serve como resumo para o
conteúdo dos demais capítulos.
Princípios básicos que determinam a orientação do livro
Podem ser identificados dois princípios que servem de base para o livro. São
eles:
Princípio implícito: livro orientado antes para o fornecedor da
informação do que para o
consumidor. Considera primordiaamente o ponto de vista do fornecedor, de
modo que é nele que o livro é focado.
Princípio explícito: "Tecnologia muda. Leis econômicas não.", afirmam
os autores logo no início do texto. Perceba o quão forte é essa afirmação, a
qual serve de base para o livro inteiro. Os autores citam no decorrer do
primeiro capítulo diversos exemplos já ocorridos, ilustrando a validade de
suas idéias. Apesar desse princípio ser questionável, o livro não deixa de ser
uma grande leitura, já que é coerente e convincente.
Por que o princípio explícito poderia não ser válido? Leis econômicas não são
exatamente
como as da Física, por exemplo: elas dependem da sociedade, a qual é um sistema complexo
adaptativo, e, portanto, podem mudar, acompanhando-a. Por outro lado, é
certamente difícil mudar as leis econômicas vigentes numa sociedade.
Tais mudanças ocorrem em geral
no contexto da mudança de fase de um sistema complexo adaptativo (lembre-se do
tema "Caos e Emergência") e desta forma é impossível prevê-las.
Constatação da Economia da Informação
O livro usa o termo 'informação' de maneira bem ampla. Tudo que pode ser
digitalizado (codificado como um fluxo de bits) é informação. Para seu
propósito, os autores consideram resultados de jogos de baseball, livros,
bases de dados, revistas, filmes, músicas, cotações e páginas da teia todos
bens de informação.
Para os bens de informação, o custo de produção da primeira cópia é enorme e o
custo de produção de cópias adicionais é desprezível. Essa constatação rege
boa parte da economia da informação, atribuindo-lhe características
diferenciadas de outros setores que não estão sujeitos a este fenômeno
(fábrica de cafeteiras, por exemplo). Exemplos para os quais o fato se aplica
são livros, discos, filmes, jornais, revistas e, mais recentemente, software e
a disseminação da informação pela teia.
Vejamos agora algumas novidades a esse respeito:
Administração de propriedade intelectual
Esse é um assunto sensível na economia da informação. A lei de direitos
autorais, pouco conhecida (ainda mais no Brasil) e reservada a poucos
especialistas, precisa mudar, readaptar-se às novidades da tecnologia. Está
mudando, mas de uma maneira ainda indefinida.
Recomenda-se a leitura do artigo de Pamela Samuelson
que trata com profundidade de direitos autorais, censura, liberdade de
informação e de Free Speach (primeira emenda à constituição americana). O
trabalho de Pamela mostra que a lei de direitos autorais, com certa
flexibilidade, pode ser usada tanto para restringir quanto para estimular o
fluxo da informação, dependendo da ocasião.
A constituição americana, famosa por ser curta, enxuta, respeitada pelos
americanos e por mudar muito pouco ao longo do tempo (somente com emendas
(adendos), sem modificações), menciona como tratar direitos autorais. Cita o
texto de Shapiro e Varian: The U.S. Constitution explicitly grants Congress
the duty "to promote the progress of science and useful arts, by securing, for
limited times, to authors and inventors, the exclusive right to their
respective writings and discoveries". Daí surgem as leis americanas de copyrights e
de patentes, que podem variar em função de diferentes interpretações dessa
diretiva constitucional (note, por exemplo, a expressão "limited times").
Novas tecnologias possibilitam novas formas de produzir cópias e de
distribuí-las, o que afeta diretamente o detentor do direito autoral e também
os outros. Direito autoral compreende um policiamento e mecanismos que façam
valer as leis. Como enfatizado em sala de aula, não se sabe como o nível que a
prática do Ciclo de Evolução da Informação alcança hoje em dia pode conviver
com a propriedade intelectual. Por exemplo, Linus Torvalds detem o copyright
do Linux, mas não é o único autor do sistema operacional. Que direitos a lei
oferece a todos os co-autores e colaboradores? Como a sociedade enxerga o
Ciclo de Evolução da Informação: deseja dele tirar proveito ou abafá-lo?
Voltando ao livro, seus autores têm uma postura consideravelmente liberal no
que diz respeito a direitos autorais. Sugerem ao empresário escolher termos e
condições que maximizem o valor de sua propriedade intelectual, e não termos e
condições que maximizem sua proteção, até porque não existe proteção
perfeita.
Informação como "bem de experiência"
A informação é um bem de experiência, ou seja, precisa ser experimentada pelo
consumidor para que esse possa avaliar seu valor. Todo produto novo, ainda
desconhecido, é um bem de experiência. A informação, por sua vez, tem uma
característica adicional: comporta-se dessa maneira toda vez que é
renovada. Um exemplo citado no livro é The Wall Street Journal. Outro,
visto em sala de aula, é o Turbo Pascal, software que fez muito sucesso como
compilador para computadores pessoais e que após novas versões foi tornando-se
desinteressante.
Uma maneira de se esquivar do problema de ter seu bem de informação provado
antes de ser comprado é adquirir boa fama. O mercado valoriza marcas
(branding) e reputações (reputation). Tanto isso é verdade que empresas são
compradas por outras, porém marcas consideradas como boas são preservadas
(exemplo: Compaq que comprou a Digital, e America OnLine que comprou a
Netscape). No exemplo do The Wall Street Journal, os interessados
compram o jornal antes de lê-lo porque ele tem fama e tradição de trazer informações de
boa qualidade.
A administração da tensão entre dar produtos de informação de presente
(amostras para experimentar) e cobrar para recuperar o investimento inicial é
muito importante e não pode ser desprezada. E, em se tratando de distribuição
de amostras gratuitas, a Internet é fantasticamente eficiente.
Economia da atenção
As seguintes palavras de Herbert Simon, ganhador de Prêmio Nobel de Economia,
resumem bem este tópico: "a wealth of information creates a poverty of
attention". Convivemos com uma sobrecarga de informações. A quantidade de
informação, muito maior do que é possível absorver, cresceu enormemente nos
últimos cinco anos com o desenvolvimento da Internet. Hoje paga-se fortunas
para conseguir um mínimo de atenção do público alvo.
A Enciclopédia Britânica encontra-se diante de dificuldades
econômicas. Continua oferecendo produtos com qualidade dificilmente
equiparada, porém tem problemas para obter a atenção de seus potenciais
consumidores, muitos dos quais se satisfazem aparentemente com produtos de
qualidade inferior e que podem ser encontrados aos montes, com preços bem
menores.
Novamente, a Internet impressiona pelas suas potencialidades no que se refere
a propaganda dirigida. Provedores de serviços de busca podem manter histórico
dos assuntos de maior interesse para os internautas. Cadastros como o que os
usuários do Hotmail preenchem quando solicitam seus serviços permitem produzir
propaganda personalizada. As possibilidades são inúmeras...
Tecnologia
A tecnologia é um invólucro para a informação que permite distribuí-la e
manuseá-la com maior facilidade. Segundo os autores, a tecnologia é para a
informação o que a garrafa é para o vinho. A Internet só ocupa seu lugar na
sociedade porque a tecnologia permite a fabricação de computadores pessoais
suficientemente poderosos a preços acessíveis.
Positive Feedback e Network Externalities
Em muitos casos o valor de um produto não é somente intrínseco, não é função apenas do que ele
faz pelo consumidor. O fato de outras pessoas usarem-no ou não faz (muita)
diferença. No exemplo do fax, é imprescindível a existência de muitos outros
usuários para que ele tenha serventia. Se o consumidor de um produto é
beneficiado pela presença de uma grande comunidade usuária desse produto, o
mesmo apresenta o que se chama de network externalities.
Um único consumidor não tem poder para afetar toda a comunidade usuária de um
produto: ele só pode comprá-lo ou rejeitá-lo. Network externalities demoram a
surgir.
A área de tecnologia digital é extremamente sujeita e sensível a network
externalities, em função da grande velocidade das mudanças e em função da
grande importância da comunicação nesta área. E sua sensibilidade é tanta que
levanta uma série de questões. Por exemplo, quando muito fortes, network
externalities podem conduzir a um padrão de fato e, no limite, ao monopólio.
O livro analisa a importância de network externalities para as empresas
fornecedoras e as estrategias disponíveis a elas no sentido de alcançarem o
padrão de fato. O Capitalismo, por outro lado, é contrário, em princípio, ao
monopólio pois isto acaba com a competição. Os EUA têm mecanismos para quebrar
monopólios (veja o atual caso da Microsoft com a justiça americana). É
possível evitar monopólios na área da informática? Se o Linux, por acaso, se
tornar um monopólio, haverá então um monopólio sem dono. Como lidar com uma
situação dessas?
Finalizando
O livro aborda vários aspectos importantes para quem quer vender seu produto
de informação
com sucesso. Produto aberto ou caixa preta? Deve-se cooperar para competir
melhor? São diversas perguntas que surgem e para as quais os autores dão suas
dicas e opiniões.
Para pensar
Encerrando a discussão sobre este tema, estão a seguir dois assuntos que podem
ser melhor estudados tendo em mente as idéias de Shapiro e Varian e as
transmitidas nas aulas:
1) MP3 - o professor comprou recentemente um aparelho Rio por US$250. Nas
últimas duas semanas o preço do mesmo equipamento caiu para cerca de
US$150, pois foi lançado outro modelo que tem o dobro da capacidade de
armazenamento. Analise os aspectos levantados no livro e na aula que
intervêm neste fenômeno?
2) O Cobalt Qube 2700WG da Cobalt
Microserver Inc. está chamando a atenção do mercado. Trata-se de um
servidor Internet/Intranet que suporta até vinte e cinco computadores PC,
Macintosh ou Unix (lembra-se de lock-in?), tem o formato de um cubo de nove
polegadas (vinte centímetros) de lado, vem com pacote de ferramentas de
grande utilidade e uma interface de browser e menus que torna sua
configuração e administração muito fácil e rápida. Tudo isso a um preço
realmente acessível: a partir de US$999 (US$1,400 por um modelo mais
sofisticado). Tem Linux como sistema operacional rodando em um chip
MIPS. Objetiva consumidores como escolas e residências, enfim, qualquer
usuário (mesmo que leigo) interessado em uma pequena rede.
Veja uma
reportagem
e um
artigo
sobre o equipamento.
Visite o grupo de usuários.
Notas de aula elaboradas por Rodrigo Antonio Quintano Neira.
MAC 333 A Revolução Digital e a Sociedade do Conhecimento
e-mail:
Imre Simon <is@ime.usp.br>