Análise Preliminar dos Dados Sísmicos de Abril de 2012

Alair Pereira do Lago1

25 de maio de 2012

Artigo em formato PDF: 11deAbril.pdf

Resumo
O dia 11 de abril de 2012 foi um dia único dentro da história da geofísica de nosso planeta. Expomos nesta análise preliminar as evidências científicas que nos apontam para o fato de que este dia foi tão especial. Ademais, esperamos lançar pistas que possam ser úteis a um eventual especialista, de posse de mais dados além do que dispomos, interessado em aprofundar-se nas descobertas das causas desta intrigante singularidade.
No dia 11 de abril de 2012, tivemos alerta de tsunami no Oceano Índico, por conta de uma sequência de terremotos com dois de magnitude acima de 8, ocorridos a oeste da ilha de Sumatra, na Indonésia. Para se entender a particularidade deste fato, convém observar que foram registrados 89 terremotos de magnitude2 pelo menos 8.0 durante os 41028 dias transcorridos de 1/1/1900 a 30/4/2012 [16]. Somente os dois últimos, os do dia 11/4/2012, ocorreram no mesmo dia. O primeiro deles, ocorrido às 08:38 UTC, foi rapidamente avaliado com magnitude 8.9 graus, sendo reavaliado para magnitude 8.6 posteriormente. O segundo, ocorrido duas horas depois às 10:43 UTC, foi avaliado com 8.2 graus. Além destes dois terremotos, outros 43 dentre os 89 tiveram magnitude pelo menos 8.2, enquanto que 44 tiveram magnitude 8.0 ou 8.1. Apenas oito tiveram magnitude maior que 8.6, enquanto que quatro deles tiveram magnitude 8.6, inclusive o primeiro terremoto do dia 11/4/2012.
Quase metade destes 89 tremores, 43, se deram na primeira metade do século passado, o que mostra uma distribuição quase que equânime entre os tremores de magnitude ao menos 8, ao se comparar os primeiros cinquenta anos do período aos demais. Em contraste, dos doze terremotos mais intensos, os de grau ao menos 8.6, apenas o terremoto do Equador-Colômbia em 1906 com 8.8 graus ocorreu na primeira metade do século passado, o que mostra uma clara
tendência de intensificação dos maiores tremores registrados.
Dos demais, três tremores com magnitude ao menos 8.6 foram registrados na década de 50 e outros três na década de 60. Da mesma forma que as décadas de 10, 20, 30 e 40, as décadas de 70, 80 e 90 experimentaram uma relativa calmaria e não registraram terremotos assim intensos. Os cinco tremores restantes dos doze mais intensos, quase metade dos terremotos com magnitude ao menos 8.6 portanto, ocorreram nos últimos oito anos, confirmando a mencionada tendência de intensificação dos terremotos mais violentos.
Convém que se observe que estes 89 não são necessariamente os terremotos que mais mataram. Mesmo terremotos mais fracos, mas com epicentros pouco profundos sob regiões mais densamente povoadas podem causar maiores estragos. É o caso do terremoto do Haiti de 2010, com 7.0 graus de magnitude e cerca de 316 mil mortos [15]. No mesmo ano, o Chile, mais preparado para conviver com terremotos, foi provado com um dos maiores terremotos da história com 8.8 graus de magnitude e muita destruição na região de Concepción. O número de mortes felizmente foi bem menor, 507. O terremoto de 7.9 graus de 2008 na China também não foi incluído e matou cerca de 87 mil pessoas, pouco mais que as cerca de 80 mil vítimas fatais no Paquistão em 2005 por um tremor de 7.6 graus. Mesmo um tremor de magnitude 6.6 como o do Irã em 2003 levou a mais de 31 mil mortos [15].
De fato, um terremoto de magnitude 6 libera uma quantidade de energia comparável à de uma bomba atômica como a de Hiroshima, equivalente à explosão de cerca de 15 kt (15 kilotoneladas de TNT). Convém também notar que as escalas de magnitude dos tremores são logarítmicas. Seguindo as convenções estabelecidas inicialmente por Richter e Gutenberger, a quantidade de energia liberada e seu potencial de destruição são multiplicados por 1000 a cada dois graus de magnitude [8]. Assim sendo, um terremoto de magnitude 8 equivale à explosão de cerca de mil bombas de Hiroshima.
figs/TremoresXDecadastth.png
Figure 1: Evolução da quantidade de tremores com magnitude mínima 5, 6, 7 e 8 ao longo de quatro décadas
Assim convém-nos também examinar os tremores de magnitude menor que 8.0. Também aqui se observa uma tendência de um aumento constante no número de tremores. Por exemplo, nas décadas de 1980, 1990, 2000 e 2010 podemos observar3 respectivamente 776, 1255, 1589 e 1929 tremores com magnitude ao menos 6, um aumento de 149% em 30 anos. Para tremores de magnitude ao menos 8.0, temos respectivamente 3, 7, 13 e 17 tremores, com um aumento de 467% em três décadas. O gráfico da figura 1 exibe este crescimento, bem como aquele verificado para tremores de magnitude ao menos 5 e ao menos 7.
É sabido que grandes tremores são seguidos de tremores menores, os tremores de repique. Para que se possa compreender quão singular foi o fenômeno que culminou com os tremores de magnitude 8 do dia 11 de abril, e o quanto isto mexeu com a própria geologia terrestre, merece que observemos os tremores de repique subsequentes. Para tanto, examinaremos os grupos formados pelos tremores de magnitude ao menos 6.0 no dia exato (UTC) e no dia seguinte dos maiores terremotos já registrados. Além de contar os tremores de cada grupo, também mediremos seu diâmetro, a maior distância entre os epicentros de dois tremores do grupo. Como usual em navegação, a partir das latitudes e longitudes, a distância é computada segundo fórmula de Haversine [14]. Convém observar que os tremores de um grupo podem ser circunscritos a uma circunferência de raio não maior que 87% de seu diâmetro.
De acordo com os registros públicos sobre os quais nossa análise se baseia [3], dos oito tremores com grau ao menos 8.7, o tremor do Alaska de 1964 foi o primeiro a registrar repiques conhecidos com magnitude ao menos 6. Assim, nesta análise, não mais mencionaremos: o terremoto de grau 8.8, no Equador, em 1906; o de 9.0, na Rússia, em 1952; o de 9.5 graus, no Chile, em 1960; o de 8.7 graus, em Rat Islands, Alaska, em 1965. Compararemos o grupo dos tremores de 11 e 12 de abril, portanto, aos tremores principais e seus repiques registrados de: Prince William Sound, Alaska, em 1964; Indonésia, em 2004; Chile, em 2010; Japão, em 2011.
Nos dois dias do terremoto ocorrido a 28/03/1964 no Alaska, foram registrados 12 tremores de magnitude ao menos 6, com um diâmetro de 632 kilômetros. Se a magnitude do abalo principal foi 9.2, a do maior repique foi 6.6. Junto ao abalo ocorrido a 26/12/2004 na Indonésia, foram registrados também 12 tremores nos dois dias, com um diâmetro de 1203 kilômetros. Se a magnitude do abalo principal foi 9.1, a do maior repique foi 7.2. Nos dois dias do tremor do Chile de 2010, foram observados 13 tremores, com um diâmetro de 1690 kilômetros. Se a magnitude do abalo principal foi 8.8, a do maior repique foi 7.4. Uma marca campeã de 45 abalos foi observada nos dois dias relativos ao terremoto de 11/03/2011, no Japão, ainda que circunscritos a uma pequena área (quadrado tracejado na figura 2), com diâmetro de 610 kilômetros apenas. Se a magnitude do abalo principal foi 9.0, a do maior repique foi 7.9.
Local Data Hora Princ Repiq Gpo. Diâm.
Alaska 28/03/1964 03:369.2 6.6 12 632
Indonésia 26/12/2004 00:589.1 7.2 12 1203
Chile 27/02/2010 06:348.8 7.4 13 1690
Japão 11/03/2011 05:469.0 7.9 45 610
Indonésia 11/04/2012 08:388.6 8.2 8 17334
Table 1: Comparação entre o tremor do dia 11/04/2012 com os maiores tremores com repiques de magnitude maior que 6 conhecidos. Maiores valores na coluna em negrito e menores valores em itálico.
Em contraste, os 8 abalos dos dias 11 e 12 de abril de 2012 tiveram um diâmetro de 17 mil e 334 kilômetros! Ademais, se a magnitude do abalo principal foi 8.6, a do maior repique foi 8.2, uma perda de apenas 0.4 em magnitude! Destes oito abalos, os quatro primeiros ficaram circunscritos a oeste da ilha de Sumatra, na Indonésia, Ásia, com um diâmetro de 403 kilômetros. Estes abalos ocorridos nas quatro primeiras horas após o primeiro e mais forte tremor incluem os terremotos de magnitudes 8.6 e 8.2. De forma inusitada porém, depois de dez horas sem tremores registrados de magnitude ao menos 6, vieram mais quatro abalos praticamente na extremidade oposta do globo, na costa oeste na América do Norte. O primeiro destes abalos deu-se junto ao estado de Oregon, ao norte da Califórnia. O segundo abalou poucos minutos depois o estado de Michoacan, ao sul do México, numa distância de 3662 kilômetros do abalo do Oregon. Observe ainda que isto é mais que o dobro do diâmetro dos 13 tremores do Chile em 2010. Cerca de oito horas depois, em questão de minutos, dois outros abalos com epicentros bem próximos ocorreram na costa mais ao norte do México, bem próximo à divisa entre os estados peninsulares da Baja California. Este grupo intermediário dista 1583 kilômetros do epicentro do tremor ao sul e 2107 kilômetros do epicentro do tremor do Oregon. Vide a ilustração dos oito tremores sinalizados com um círculo preto na figura 2 e um resumo comparativo na tabela 1.
figs/Quakes2012April11tth.png
Figure 2: Terremotos de magnitude ao menos 6 nos dias 11-12 (8 círculos) e 13-17 (6 quadrados) de abril de 2012. O mês teve apenas outros 5 terremotos de magnitude ao menos 6 (tabela 3). Quadrado tracejado circunscreve 45 terremotos de 11-12/03/2011.
Além do fato único de ter havido um duplo tremor de magnitude 8 no dia 11 de abril, é inusitada também a ação global das causas destes tremores em todo o globo terrestre. Também isto parece ser inédito e intrigante aos especialistas. De fato, no dia 13 de abril o jornal Bucharest Herald, na Romênia, publicou artigo com os seguintes comentários aparentemente perplexos do sismologista líder de seu país:
The Earth is shaking! Scientists find no explanation to the 39 earthquakes that rocked the planet in just two days. "Something is wrong! There are too many strong earthquakes" believes Romania’s top seismologist, Gheorghe Marmureanu, who finds the latest Indonesian quake very unusual. [...] "Statistics show that, in this region of Asia, there is one big earthquake every 500 years, roughly. However, since 2004, there already were three quakes with magnitudes above 8, which is out of seismological statistics. Something is wrong! There are too many big quakes in the Indonesian area," Marmureanu warns.4 [9]
Dois dias depois, o jornal Croatian Times publicou artigo intitulado "Quake Expert: Earth Cracking Up"5 onde o jornal assim resumia as declarações de Marmureanu:
"A leading earthquake scientist has warned that the planet could be cracking up after a series of massive quakes in just 48 hours."6 [17]
Data Hora Mag
2004/12/26 00:58 9.1
2005/03/28 16:09 8.6
2007/09/12 11:10 8.5
2012/04/11 08:38 8.6
2012/04/11 10:43 8.2
Table 2: Os cinco tremores de magnitude 8 na região da ilha de Sumatra
De fato, com estes duplos abalos do dia 11, são cinco os tremores registrados com magnitude ao menos oito na costa oeste da ilha de Sumatra, Indonésia, conforme podemos conferir na tabela 2. O primeiro deles, o de 2004, provocou tsunami e um total de 227 mil e 898 mortes pelo mundo, 170 mil dos quais se verificaram na própria província de Aceh, na ilha de Sumatra, o que explica o pânico que se viu na localidade quando o alerta de tsunami foi levantado no dia 11 de abril. Ademais, com dados do dia 26 mais consolidados que os do dia 13, podemos observar que foram registrados 54 terremotos de magnitude 5 ou mais nos dias 11 e 12 de abril.
Se nos dias 11 e 12 houve 8 tremores de magnitude ao menos 6, mais 6 tremores da mesma classe de magnitude foram registrados pelo globo até o dia 17. Não foram registrados novos tremores desta magnitude nos dias 18, 19 e 20. Destes tremores, três foram observados junto ao extremo sul da América do Sul, dois outros entre a Papua e a Nova Zelândia e somente um deles foi verificado na região de Sumatra, o que confirma que as causas naturais que provocaram os duplos tremores do dia 11 e uma atividade sísmica intensa na região produziram também um impacto global no planeta que perdurou por vários dias, ainda que de forma menos intensa que a oeste da ilha de Sumatra. Pode-se ver a localização destes novos tremores na figura 2, onde eles se encontram sinalizados com um pequeno quadrado preto.
Como podemos verificar na tabela 3, apenas cinco outros tremores de magnitude ao menos 6 foram verificados fora desta semana em abril de 2012.
Dia Hora Mag Latitude Longitude Local
02 17:36 6.0 16.456 -98.296 Acapulco
06 16:15 6.1 -4.566 153.502 I. Salomão
11 08:38 8.6 2.294 93.078 Sumatra
11 09:27 6.0 1.281 91.730 Sumatra
11 10:43 8.2 0.796 92.462 Sumatra
11 11:53 6.4 2.929 89.534 Sumatra
11 22:41 6.0 43.584 -127.638 Oregon
11 22:55 6.7 18.218 -102.681 Michoacan
12 07:06 6.0 28.854 -113.029 Baja Calif.
12 07:15 7.0 28.624 -113.116 Baja Calif.
14 10:56 6.2 -57.677 -65.296 T. do Fogo
14 22:05 6.3 -18.972 168.735 Vanuatu
15 05:57 6.2 2.583 90.268 Sumatra
17 03:50 6.7 -32.701 -71.484 Chile
17 07:13 6.8 -5.462 147.120 Papua
17 19:03 6.2 -59.005 -16.655 O. Antárt.
21 01:16 6.7 -1.604 134.276 Papua
23 17:36 6.0 -28.487 -177.352 I. Fiji
28 10:08 6.7 -18.679 -174.707 I. Fiji
Table 3: Terremotos de abril de 2012 com magnitude ao menos 6.0. Dos 19 tremores, 14 ocorreram na semana de 11 a 17, sendo que 8 deles ocorreram nos dias 11 e 12.
Se o tremor principal do dia 11 não foi o maior da história, parece ter sido o de maior magnitude entre aqueles abalos conhecidos que tenham sido provocados em fendas verticais (também chamadas de transcorrentes ou strike-slip), como observaram diversos especialistas.
The biggest earthquakes tend to occur in subduction zones where one plate of the Earth's crust dives under another. This grind produced the 2004 magnitude-9.1 Indian Ocean disaster and the magnitude-9 Japan quake last year.7
    Wednesday's magnitude-8.6 occurred along a strike-slip fault line similar to California's San Andreas Fault. Scientists say it's rare for strike-slip quakes, in which blocks of rocks slide horizontally past each other, to be this large.8
"It's clearly a bit of an odd duck," said seismologist Susan Hough of the U.S. Geological Survey in Pasadena, Calif.9
[...]
Wednesday's quake was followed by a magnitude-8.2 aftershock. Both were strike-slip quakes.10
"A week ago, we wouldn't have thought we could have a strike-slip earthquake of this size. This is very, very large," said Kevin Furlong, a professor of geosciences at Penn State University.11
So large, in fact, that the main shock went into the history books. [...] It's probably the largest strike-slip event though there's debate about whether a similar-sized Tibet quake in 1950 was the same kind.12
A preliminary analysis indicates one side of the fault lurched 70 feet [21 meters] past the other - a major reason for the quake's size. By contrast, during the 1906 magnitude-7.8 San Francisco earthquake along the San Andreas - perhaps the best known strike-slip event - the ground shifted 15 feet [5m].13
The Sumatra coast has been rattled by three strong strike-slip quakes since 2004, but Wednesday's was the largest.14 [4]
figs/GheorgheMarmureanu.jpg
Figure 3: Gheorghe Marmureanu, sismologista líder na Romênia foi responsável pela implantação de um sistema de monitoramento de terremotos para Bucareste [18]
De fato, no raio de 50Km do tremor de magnitude 8.6, foram registrados três outros tremores do tipo strike-slip nas datas de 19/04/2006, 04/10/2007 e 10/01/2012, respectivamente com magnitudes 6.2, 6.2 e 7.215. O mais forte dos três possui magnitude 1.4 menor que o tremor mais forte de 11/4/2012, o que implica que a energia liberada por este tremor foi 126=10001.4/2 vezes maior que o maior dos precedentes.
Seismologists say last week's powerful earthquake off western Indonesia increased pressure on the source of the devastating 2004 tsunami: a fault that could unleash another monster wave sometime in the next few decades.16
"The spring was pushed a little bit tighter," said Kerry Sieh, director of the Earth Observatory of Singapore.17
The timing of another megathrust temblor, if it's on the way, "could have been advanced by a few years," he said.18 [...]
Stresses loading up on the fault for centuries were relieved only about halfway eight years ago, Sieh [said]. And last week's tremor effectively squeezed the overlapping tectonic plates that form the fault.19 [...]
Danny Hilman Natawidjaja, a geologist with the Indonesia's Institute of Science, agreed that last week's quake piled a small amount of new stress onto the megathrust, and that "both Aceh and Padang need to be prepared."20 [5]
Este aumento da tensão das placas observado acima também é surpreendente, pois o que seria de se esperar é que os tremores desde 2004 na região tivessem a tendência de aliviar paulatinamente estas tensões ainda represadas no subsolo e não aumentar as pressões sobre as falhas sobre as quais agiu o tremor de magnitude 9.1 ocorrido em 26/12/2004. De certa forma, isto é uma evidência de que as origens dos tremores de 11/04/2012 possam ser dissociadas das causas do megatremor de 2004, e talvez até mesmo mais potentes.
Uma possível explicação poderia ser encontrada fora até mesmo de causas geológicas da Terra. Por exemplo, o impacto de um meteoróide com a Terra, como o de Revelstoke na costa oeste do Canadá, a 31/3/1965, foi avaliado como de 20kt (20 kilotoneladas de TNT) [12], enquanto que o da Indonésia a 8/10/2009 foi avaliado com 50kt [13]. A 22/04/2012, dois dias após uma bola de fogo ser vista em três estados do sudeste brasileiro, foi registrado o impacto de cerca de 5kt de um meteoróide do tamanho de uma minivan sobre a Califórnia, depois de ser observado como uma bola de fogo cortando o céu do estado de Nevada em plena luz do dia [2]. Apesar de se usar o termo impacto, de fato o que houve nestes casos foi uma explosão na atmosfera, sendo que nos casos norte-americanos foram encontrados meteoritos no solo das regiões em questão. Ainda assim, não encontramos qualquer informação a respeito de eventuais crateras nem tampouco terremotos que tenham sido causados pelo impacto dos meteoritos com o solo. Embora menos estudado, quando houve a queda do meteorito de Arequipa, Peru, a 2/2/2004, os sismógrafos locais registraram tremores de magnitude 3.8 nos instantes próximos à queda, sendo que um meteorito e uma cratera foram encontrados dois anos depois nas imediações, em Aplos [6] [7].
figs/MeteoroApril11tth.jpg
Figure 4: Sobreposição de 3 seg de imagens do meteoro visto em Madison, Wisconsin a 11/04/2012 [1]
Esta bola de fogo do dia 22/4/2012, observada sobre os céus da Califórnia e Nevada nos EUA, era brilhante a ponto de ser observada e fotografada mesmo de dia. Mesmo assim não foi o meteoro mais relatado em abril de 2012, conforme os relatos registrados no site21 The Latest Worldwide Meteor / Fireball Reports22, um site bastante conhecido por aqueles que se interessam por informações mais ágeis sobre meteoros, principalmente em solo norte-americano. Segundo os registros ali feitos, o mês de abril de 2012 apresentou uma média de cerca de 21 relatos diários de meteoros avistados, entre os quais, diversos relatos atribuídos ao meteoro do dia 22, que apesar da raridade e da explosão ouvida, não foi o dia mais profícuo em relatos. Somente cinco dias obtiveram uma quantidade de relatos igual ou superior à média de 21 para um mês que apresentou uma mediana de 8.5 relatos por dia. Os cinco dias mais "meteóricos" foram justamente os dias 11, 2, 22, 12 e 10, respectivamente com 238, 92, 54, 41 e 21 observações de meteoros relatadas.
Uma inspeção rápida dos relatos do dia 11, tão rico em tremores de magnitude 6 ou superiores ao longo do planeta mas também coincidentemente tão rico relatos de meteoros, nos permite observar que embora a maioria dos 238 relatos tenha sido sobre o mesmo meteoro observado sobre os céus de estados do centro-oeste norte americano, às 20:21hs locais [1], diversos relatos foram feitos de outros meteoros observados sobre regiões povoadas do planeta. Também os dias 10 e 12 foram ricos em relatos.
Código Dist Mag Diam Dia Hora
(au) est(m)
2012 HN 0.0175 23.8   58 10/4 19:18
2012 GD 0.0242 26.9   14 10/4 08:35
2004 RQ252 0.0338 22.4 112 13/4 12:08
2012 GD2 0.0464 22.8   93 12/4 00:41
2004 FG11 0.0574 20.9 223 10/4 18:40
2012 FO35 0.0575 23.6   64 13/4 08:45
2012 HJ31 0.0597 24.5   42 13/4 10:15
Table 4: Sete asteróides com distância menor que 0.06 ua em relação à Terra registrada entre os dias 10 e 13 de abril de 2012
De fato, conforme os registros de asteróides mais próximos da Terra feitos pela NASA23, sete asteróides com órbitas que cruzam com as da Terra estiveram próximos dela por uma distância não superior a 0.06 au (6% da distância média da Terra ao Sol) entre 08:35 hs do dia 10 e 12:08 do dia 13 de abril de 2012, como pode ser conferido na tabela 4. Ademais, a proximidade de asteróides com frequência traz junto de si outros corpos celestes eventualmente menores e não catalogados, o que pode possivelmente explicar a riqueza de relatos de meteoros entre os dias de 10 a 12 de abril. Convém observar que um asteróide cuja trajetória cruze com a da Terra é considerado potencialmente perigoso pela NASA24 ( Potentially Hazardous Asteroids no inglês) quando sua trajetória o coloca numa distância não superior a 0.05 au e a magnitude absoluta (do brilho observado do asteróide) não excede 22.0. Em particular, devido à restrição da magnitude, o asteróide 2004 FG11 é o único dos sete asteróides da tabela 4 que é classificado como potencialmente perigoso, já que a 20/05/2010 esteve a 0.0390 au da Terra. Os quatro dígitos iniciais dos códigos dos asteróides referem-se ao ano em que foram descobertos, de forma que dois destes sete asteróides já eram conhecidos desde 2004 enquanto que a maioria deles, os outros cinco, foram descobertos somente neste ano de 2012, muito possivelmente próximo aos dias de maior aproximação25.
Dada a proximidade relativa destes sete asteróides em relação à Terra entre os dias 10 e 13 de abril de 2012, dados os vários relatos de meteoros observados no dia 11, dado o fato inédito de termos dois terremotos com magnitude acima de oito no mesmo dia 11 de abril, dado o fato único de termos tantos tremores de magnitude ao menos 6 espalhados pelo globo, tanto nas primeiras 24 horas após o tremor de magnitude 8.6 (outros sete) quanto na primeira semana subsequente (outros seis tremores), ao contrário do que acontece quando observamos os tremores de repique de um grande tremor que são sempre localizados, dado o estranho aumento observado das tensões sobre a falha que gerou o megatremor de magnitude 9.1 em 2004 na região, é de se perguntar se os tremores observados no dia 11 e na semana subsequente não terão sido provocados por um evento também singular, de efeito mais global, como por exemplo a queda de um pequeno asteróide sobre a Terra. Tendo acontecido tal fato, eventualmente sobre o próprio Oceano Índico, certamente poderíamos esperar por avisos de tsunami e, conforme o tamanho do asteróide, terremotos de grande magnitude, como foram observados.
figs/CrateraArizona.jpg
Figure 5: Cratera do Meteoro, Arizona
Diversos cientistas acreditam que a famosa cratera do meteoro em Winslow no Arizona, com 1.2km de diâmetro, foi formada pela colisão de um asteróide originariamente de cerca de 40 metros de diâmetro e 300000 toneladas, com a cratera sendo formada pela explosão de pelo menos 2500kt oriunda da parte do asteróide que teria resistido ao atrito com a atmosfera [11][10]. Que os dados sísmicos nos apontam para uma singularidade excepcional no dia 11 de abril de 2012, nós já observamos. Isto em si já faz deste dia um dia único na história da geofísica terrestre. Quem sabe não possa ser uma queda de um novo asteróide a explicação para tantas singularidades observadas no dia 11 e nos dias subsequentes? A análise dos dados sísmicos do dia seriam de grande utilidade para confirmar ou descartar esta hipótese explicativa!


(PDF disponível: http://www.ime.usp.br/~alair/FilomenaAndTheKing/2012/11deAbril/11deAbril.pdf)

Referências

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[2]
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[3]
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Randall Gregory. Witnessed meteorite fall - southern peru. http://www.nuggetshooter.ipbhost.com/index.php?showtopic=6757&st=0, April 6 2006. Email sent to a Meteorite Hunting and Collecting Forum.
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Thomas H. Maugh II. The crater mystery cracked? Los Angeles Times, March 12 2005. Available at http://articles.latimes.com/2005/mar/12/science/sci-meteor12.
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Friedemann Wenzel and Gheorge Marmuraenu. Rapid earthquake information for bucharest. Pure and Applied Geophysics, 164(5):929-939, 2007.

Footnotes:

1Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.
2As medidas de magnitude fornecidas são as magnitudes de momento propostas por Kanamori [8] em 1977 e que estendem a conhecida escala Richter sem os efeitos de saturação para grandes tremores.
3Os valores para a década de 2010 são projetados para a década a partir da multiplicação dos dados observados de 1/1/20120 até 30/4/2012 por um fator de 30/7.
4A Terra está tremendo! Os cientistas não encontram explicação para os 39 terremotos que abalaram o planeta em apenas dois dias. "Algo está errado! Há muitos terremotos fortes", acredita o sismólogo líder da Romênia, Gheorghe Marmureanu, que considera o último o tremor da Indonésia muito incomum. [...] "As estatísticas mostram que, nesta região da Ásia, há um grande terremoto a cada 500 anos, aproximadamente. No entanto, desde 2004, já houve três terremotos com magnitudes acima de 8, o que está fora das estatísticas sismológicas. Algo está errado! Há muitos grandes terremotos na região da Indonésia," Marmureanu adverte.
5"Especialista em terremotos: a Terra está rachando"
6"Um cientista líder em terremotos alertou que o planeta poderia estar sofrendo um colapso após uma série de terremotos maciços em apenas 48 horas."
7Os maiores terremotos tendem a ocorrer em zonas de subdução onde uma placa da crosta terrestre afunda debaixo da outra. Esta moagem produziu o desastre de magnitude 9.1 em 2004 no Oceano Índico e o terremoto de magnitude 9 no Japão no ano passado.
8O tremor de magnitude 8,6 desta quarta-feira ocorreu ao longo de uma linha de falha transcorrente semelhante à falha de Santo André na Califórnia. Os cientistas dizem que é raro para terremotos transcorrentes em que blocos de rochas deslizam horizontalmente umas sobre as outras serem assim grandes.
9"É claramente um pedaço de um patinho feio", disse a sismologista Susan Hough do Serviço Geológico dos EUA, em Pasadena, Califórnia.
10O tremor desta quarta-feira foi seguido por um tremor de magnitude 8.2. Ambos foram terremotos transcorrentes.
11"Há uma semana, não teria pensado que poderíamos ter um terremoto transcorrente deste tamanho. Isto é muito, muito grande", disse Kevin Furlong, um professor de geociências na Penn State University.
12Tão grande, de fato, que o choque principal entrou para os livros de história. [...] É provavelmente o maior evento transcorrente embora haja debate sobre se um o tremor de tamanho semelhante no Tibete em 1950 era do mesmo tipo.
13Uma análise preliminar indica que um lado da falha deslocou 70 pés [21 metros] além do outro - uma razão importante para o tamanho do terremoto. Em contraste, durante o terremoto de São Francisco - de magnitude 7.8 ao longo da falha de Santo André em 1906 - talvez o evento transcorrente mais conhecido - o solo deslocou apenas 15 pés [5 metros].
14A costa de Sumatra foi atingida por três fortes terremotos transcorrentes desde 2004, mas o da quarta-feira foi o maior.
15Vide http://earthquake.usgs.gov/earthquakes/eventpage/usc000905e
16Os sismólogos dizem que o forte terremoto da semana passada além do oeste da Indonésia aumentou a pressão sobre a fonte do tsunami devastador de 2004: uma falha que poderia desencadear uma nova onda monstro em algum momento nas próximas décadas.
17"A mola foi apertada um pouco mais", disse Kerry Sieh, diretor do Observatório Terrestre de Singapura.
18O momento de um outro gigante tremor de impulso, se ele está a caminho, "poderia ter sido adiantado de alguns anos," disse ele. [...]
19As pressões acumuladas na falha durante séculos foram aliviadas aproximadamente apenas pela metade oito anos atrás, Sieh [disse]. E o tremor da semana passada efetivamente comprimiu as placas tectônicas sobrepostas que formam a falha.
20Danny Hilman Natawidjaja, um geólogo do Instituto de Ciências da Indonésia, concordou que o tremor da semana passada acumulou uma pequena quantidade de nova tensão sobre a zona de subdução, e que "tanto Aceh quanto Padang precisam estar preparadas."
21Vide http://thelatestworldwidemeteorreports.blogspot.com
22Os últimos relatos mundiais de meteoros e bolas de fogo
23Vide http://neo.jpl.nasa.gov/ca/
24Vide http://neo.jpl.nasa.gov/neo/groups.html
25Mais informações sobre cada um dos asteróides pode ser obtida da própria NASA através da URL http://ssd.jpl.nasa.gov/sbdb.cgi?sstr=CODIGO;cad=1, onde CODIGO é o código do asteróide (tabela 4), incluindo um espaço em branco. Os diâmetros estimados foram obtidos pelo conversor disponível em http://www.physics.sfasu.edu/astro/asteroids/sizemagnitude.html, com albedo adotado 0.154, conforme adotado pela própria NASA.