“Televisão não combina com nada!”

A entrevista comigo, com esse título, publicada na revista Kalunga foi composta por esta a partir de uma gravação. Infelizmente,  o texto final não me foi encaminhado para revisão (ver o original no vínculo logo abaixo).  Nesta versão, coloco um texto revisado dessa entrevista, aproveitando para incrementá-la um bocado, conservando no entanto as perguntas do original e sua ordem.  Adicionei também vários vínculos para meus artigos em meu site. Provavelmente este meu texto final teria ultrapassado o espaço disponível na revista; no entanto, assuntos sérios, dirigidos à compreensão das pessoas, têm que ser elaborados.  V. W. Setzer, 1/3/09.


Revista Kalunga
fevereiro/2009 (Ano 36 - n. 216)
Matéria "Televisão não combina com nada" - entrevista exclusiva com o Prof. Valdemar Setzer, autor do livro Meios eletrônicos e Educação (3 páginas)
Tiragem: 250 mil exemplares/mensal/nacional



Formado em engenharia eletrônica pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) em 1963, e com doutorado pela Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Valdemar W. Setzer foi professor assistente na Universidade do Texas, em Austin, e professor visitante na Universidade de Stuttgart, na Alemanha. Atuaou como consultor nas áreas de engenharia de software, bancos de dados e sistemas de gerenciamento de competências em empresas e autarquias, como a Prodesp e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Entre os 12 livros publicados ao longo de sua carreira (inlcusive na Inglaterra, Alemanha e Finlândia), está Meios Eletrônicos e Educação – Uma visão alternativa, que reúne textos com uma visão diferenciada sobre o papel das tecnologias, dos videogames aos televisores, passando pelos computadores e pela Internet, na Educação. Em seu site www.ime.usp.br/~vwsetzer encontram-se inúmeros artigos de sua autoria em várias línguas, inlcusive alguns recentes com uma enorme quantidade de referências a pesquisas científicas que corroboram suas idéias sobre os efeitos negativos dos meios eletrônicos em crianças e adolescentes. Nesta entrevista, ele fala da influência desses meios sobre os usuários, em especial, daqueles usados na educação.
O senhor assiste televisão?
Eu tenho uma televisão, mas nunca assisto porque não há nada que seja realmente interessante ou mais importante do que eu tenho constantemente a fazer: ler, estudar, escrever, praticar esportes diariamente, respoder e-mails, manter dois sites, brincar com meus netinhos e ler para eles, socializar com minha esposa e amigos, etc.  Se eu entro numa sala de visitas e vejo uma TV, fico um pouco surpreso, pois o aparelho enfeia o ambiente, não combina nada. Além disso, existe o problema de que a televisão não deve fazer parte das famílias. Esse é um erro muito grande, pois as pessoas têm que fazer uma força enorme para resistir e não ligá-la. Eu não tenho o problema de ligá-la pois tenho consciência dos males que ela causa. Além disso, ela está num canto da estante de nosso escritório, coberta com um paneau (para esconder sua feiúra) e ainda um quadro na frente. Obviamente, a situação muda em relação a assistirem-se DVDs, mas nesse caso trata-se de um uso especial, previamente planejado e escolhido.

Qual o efeito da tevê sobre as pessoas?
O pensamento das pessoas deixa de ser ativo, e passa a ser quase que totalmente passivo. Há, portanto, como que um 'desligar' do pensamento.  Isso já foi provado por meio de estudos neurofisiológicos. Por exemplo, começa a haver predominância das ondas cerebrais alfa, que é o que ocorre quando uma pessoa fecha os olhos, e indica normalemtne um um estado de desatenção, de sonolência, semi-hipnótico. As imagens vêm prontas na tela, e sucedem-se com enorme rapidez. Assim, não há possibilidade de se imaginar, criar imagens mentais, como é absolutamene essencial no caso da leitura, por exemplo de um romance.  Proponho que os leitores da revista façam uma experiência: liguem a televisão e tentem pensar conscientemente em cada imagem vista, e em cada fala que estão sendo transmitidas. Vão sentir-se mentalmente exaustos rapidamente; vão sentir como há uma necessidade de 'desliga' o pensamento ativo, relaxar mentalmente.

O que ocorre durante esse estado?
O ser humano grava todas as suas vivências, em geral no subconsciente ou, então, no profundo inconsciente. A gravação é tanto mais profunda quanto mais inconsciente a vivência. Isso significa que um jovem, ao chegar à idade da universidade, aos 18 anos, já tem em média pelo menos 20 mil horas de lixo mental televisivo guardado dentro de si. Pesquisas realizadas nos Estados Unidos constataram que um jovem com 18 anos já assistiu, em média, a 200 mil atos de violência na televisão. As pessoas acham que a TV é um aparelho simplesmente de lazer, mas esquecem que o ser humano grava tudo. Essa gravação vai acabar influenciando os pensamentos e atitudes do telespectador. Em 2002 o McDonald's gastou, só em propaganda na TV, só nos Estados Unidos, 510,5 milhões de dólares, conforme Susan Linn, autora do excelente livro publicado pelo Instituto Alana,  Criaças do Consumo – A infância roubada. Essa enorme empresa não gastaria essa fábula à toa: gastou-a por que deu polpudos lucros, fazendo com que pessoas passem na frente de uma lanchonete da cadeia e sintam vontade de comer lá, sem saberem por que. Voltando à questão do lazer, este deveria ser construtivo, ativo, e não destrutivo e passivo como ver TV.

Essa passividade tem sido bastante estudada no meio acadêmico?
Sim. Marshall McLuhan disse que a mensagem está muito mais para o meio do que para o conteúdo. Isto é, se o meio é a televisão, vai ser transmitido algo por causa do meio, e não pelo conteúdo que está sendo transmitido. Para atrair o telespectador, e não deixá-lo passar de um estado de sonolância para o de sono profundo, tudo tem que virar show. E essa transmissão vai resultar na gravação no subconsciente. Os leitores vão me achar absolutamente radical por causa do que vou falar: a televisão foi, em extensão, a maior tragédia que aconteceu com a humanidade. Mais da metade da humanidade é bestificada diariamente por esse aparelho. Aqui no Brasil, cerca de 98% dos lares têm televisão. Há lares sem geladeira, mas com televisão. Para amainar um pouco a impressão de radical, adianto que sou favorável ao uso da TV em classes nas escolas: para ilustração do que está sendo ensinado, desde que seja muito breve, de poucos minutos, com repetição entremeada com discussões com os alunos sobre o que foi visto. Mas isso apenas a partir da atual 8a. série (antiga 7a.). Antes disso, o mais importante é incentivar a imaginação das crianças.

As pessoas gostam de ver violência na televisão?
Não! Isso é um erro profundo. A pessoa está fisicamente estática (nem é mais preciso levantar-se para mudar de canal...), e não está pensando conscientemente. Portanto, a televisão transmite essencialmente para os sentimentos do telespectador. Quanto mais emoção, melhor o programa é considerado, maior a audiência (e as estações de TV vivem de vender número de telespectadores aos anunciantes, como já escreveu B.S. Centerwall em 1992). As imagens são pequenas e grosseiras. Quando se mostra uma pessoa, nunca é de corpo inteiro, é sempre do tronco pra cima, por quê? Para mostrar a expressão do rosto que está ligada com a emoção. Ora, violência é algo movimentado e cheio de emoção, portanto é o que a TV melhor transmite, isto é, o que mais prende a atenção do telespectador, e não o que ele mais gosta. Isso não passa em brancas nuvens: há centenas de pesquisas que comprovam os efeitos da violência na televisão sobre a agressividade a curto, médio e longo prazos. Além da violência (inclusive em  esportes), outra receita infalível para atrair telespectadores é o uso de competição e de erotismo. Competição é antissocial por natureza: quem ganha fica feliz às custas da frustração de quem perde. Dever-se-ia educar para a cooperação, e não para a competição. O erotismo é extremamente prejudicial antes da puberdade, pois acelera indevidamente a maturação sexual, sem que haja um desenvolvimento paralelo de outras capacidades. Isso obviamente produz desequilíbrios psicológicos. Além disso, por exemplo, o aumento da gravidez de meninas adolescentes é uma consequência da maturação sexual sem o desenvolvimento da responsabilidade.

O video game é muito pior do que a televisão?
Sim, muitíssimo pior. Poucas pessoas conhecem a origem dos videogames violentos. Eles surgiram a partir de um estudo do exército norte-americano para descobrir qual era o melhor meio de dessensibilizar um soldado. Por exemplo, na guerra das Malvinas, os soldados ingleses estavam dessensibilizados e os argentinos não. Resultado, os ingleses acertavam 90% dos tiros, os argentinos 20%. Os americanos desenvolveram simuladores para os soldados usarem no computador para treinarem matar, e isso foi o meio mais eficiente para dessensibilizar os soldados, isto é, acabar com sua repulsa natural de matar alguém. Uma das pessoas envolvidas nesse processo foi o tenente-coronel reformado David Grossman (ex-professor de Psicologia da Academia Militar de West Point e da Universidade de Arkansas, nos Estados Unidos), especializado em dessensibilização de soldados. Passado algum tempo, Grossman viu uma loja vendendo, como jogo eletrônico, o simulador que estava sendo usado pelos soldados. Ele cunhou o termo 'killology' (matarlogia), saiu do exército e é o autore principal do livro Stop Teaching Our Kids to Kill: A Call to Action Against TV, Movie and Video Game Violence, o equivalente a “Parem de ensinar nossas crianças a matar: um apela à ação contra violência em TV, filmes e video games".

Por isso o video game é mais nocivo do que a televisão?
O videogame não condiciona só pela imagem, mas também pela ação. Se a ação é de atirar, atirar, atirar, matar, matar, obviamente está induzindo à ação de agressão. O aumento da agressividade a curto, médio e longo prazo devido ao uso de video games violentos já foi comprovado no laboratório e na vida real. Ela pode manifestar-se em vários graus, desde a agressão verbal até a agressão física. A partir do momento em que os computadores ficaram mais rápidos, as telas com maior resolução, surgiram os games chamados ego shooters, o atirador na primeira pessoa. Isto é, há vários personagens e o jogador identifica-se com um deles, e esse personagem atira nos demais, caso contrário, é morto virtualmente. Quando uma pessoa age inconscientemente, como devido a um stress, à raiva, à urgência de uma ação rápida em caso de perigo, etc., ela fica sujeita ao enorme condicionamento feito pelos video games.

Com isso, muitas crianças têm dificuldade em se relacionar com outras.
O video game, a televisão, o computador e a Internet são antissociais, o que já foi provado estatísticamente. No caso da Internet, o relacionamento virtual prejudica o relacionamento pessoal, sem falar que é perigosíssimo para crianças e adolescentes (ver meu artigo "Como proteger seus filhos da Internet", uma resenha do livro de Gregory Smith, How to Protect your Chidren on the Internet. Uma criança de 12 anos acha que está em um chat com uma outra de 12 anos e vai ver é um homem de 40 anos. Smith chama a atenção para o fato de todas as crianças e adolescentes serem ingênuos. O número de crimes cometidos por causa da Internet está aumentando enormemente.  Pesquisas recentes têm mostrado que o perigo mais frequente é ainda outro: intimidação por parte de outras crianças e adolescentes (bullying), o que já levou adolescentes ao suicídio.

Então a Internet é dispensável para crianças e adolescentes?
Sim, totalmente, desde que os professores deixem de pedir trabalhos (erroneamente chamados de 'pesquisa'...) feitos com a Internet. Qunato maior o uso de computadores e internet, pior o rendimento escolar. Isso foi provado com vários estudos estatísticos, entre os quais dois, um alemão e outro brasileiro.  usaram os mesmos dados do Sistema de Avaliação do Ensino Básico (SAEB) brasileito. O estudo alemão, feito no Instituto de Economia da Comunidade Europeia e o estudo brasileiro desenvolvido na Unicamp (Universidade de Campinas) concluíram que, quanto mais os estudantes utilizam o computador, pior o rendimento escolar. Vejam-se citações dos dois trabalhos e ainda de outros nos meus artigos "Os efeitos negativos dos meios eletrônicos em crianças e adolescentes" e "Considerações sobre o projeto 'Um laptop por criança'". Eu já tinha previsto isso há mais de 30 anos (ver meu artigo "O computador como instrumento do cientificismo". Um dos argumentos que se usa para justificar esse desastre é que o computador e a Internet acabam ocupando tempo que deveria ser dedicado aos estudos. Isso certamente é válido, mas meu argumento principal é muito mais profundo: o computador força um pensamento lógico-simbólico, que não é adequado para crianças e adolescentes antes da puberdade, isto é, antes dos 15 anos. Antes dessa idade, o pensamento deve ser flexível, imaginativo, e não formal. Isso acaba prejudicando a mente, a capacidade criativa e de resolver problemas.

Há pais que utilizam esses meios como babás eletrônicas, como é possível reverter essa situação?
Muitas mães, em troca de um pouco de sossego, põem as crianças na frente da televisão. As crianças ficam grudadas no aparelho, em um estado de sonolência. Estão sendo bestificadas. Após se desligar o aparelho, a criança tem um surto de hiperatividade, porque ficou acumulando energia; foi obrigada a ficar parada, até mentalmente, o que não é absolutamente normal de uma criança; uma criança sadia não anda, corre. O que a mãe faz, então? Liga a televisão para acalmá-la. Ela está abdicando da educação. No caso do video game a situação é ainda pior, como já relatei.

Em caso de proibição, a criança não vai assistir ou jogar escondido?
A questão não é de proibir, é de não ter, ou manter o aparelho trancado ou desligado, para não fazer parte da vida da criança ou adolescente. Por exemplo, como eu já disse, a TV não deve ficar disponível, fazer parte da família. Deve eventualmente ser usada apenas em ocasiões especiais, quando a família decide que vale a pena assistir um determinado programa – por exemplo, a entrevista que dei no programa Roda Viva da TV Cultura, em 1/12/09 (mas o melhor mesmo seria assistir uma gravação em DVD e parar a transmissão e repetir, para levar à reflexõ consciente; posso enviar uma cópia do DVD para ser copiada, se houver interesse). Uma criança que foi educada com coisas negativas não será posteriormente capaz de distinguir o que é negativo do que é positivo; por exemplo, não perceberá o horror que são os video games violentos. Por isso é que são vendidos tantos brinquedos grosseiros, monstruosos, como os dinossauros. Criança tem de ver só o que é bom, belo e verdadeiro para, depois, poder distinguir do que é mau, feio e falso.

Mas isso é possível?
Claro que é! É uma questão de educação. Isso aconteceu com meus quatro filhos e está acontecendo com meus seis netinhos. Quando são educadas desde crianças sem televisão, video game, computador e Internet as crianças e jovens não vão pedir, porque não fazem parte da vida delas. Elas vão ter milhões de outras coisas para fazer; serão imaginativas, fantasiosas, ativas, como eram meus filhos e são meus netos. Sabe o que significa uma criança pegar uma cadeira e sair brincando de barquinho, de casinha ou de castelo? Uma das coisas garantidas que a televisão e o video game fazem é acabar com a imaginação, porque a imagem já vem pronta, não há nada a imaginar, e nem dá tempo para isso, pois logo vem na tela alguma nova imagem. Há acadêmicos e profissionais que tentam mostrar benefícios do video game usando, por exemplo, o efeito de catarse – palavra introduzida por Aristóteles para uma pessoa que, ao fazer teatro, dava vazão aos seus instintos. Como citou o neurofisiólogo alemão Manfred Spitzer, em seu extraordinário livro Vorsicht, Bildschirm! (Cuidado, tela!) não há nenhum trabalho científico mostrando que o efeito de catarse existe ou seja benéfico. É tudo especulação psicológica. ATENÇÃO: qualquer resultado benéfico dos meios eletrônicos em crianças e adolescentes é suplantado infinitamente pelos prejuízos educacionais, físicos, psicológicos e psíquicos que eles produzem.

Mas os pais podem controlar o que seus filhos assistem na tevê ou os sites que acessam?
Eles não podem controlar o conteúdo, por exemplo de um programa de TV. No caso da Internet, se um pai acha, erroneamente, que ela é mais benéfica do que maléfica para os seus filhos, só há uma atitude a tomar: ficar ao lado da criança e do adolescente enquanto eles navegam. De longe, a pior situação é colocar uma TV, um video game, um computador, um acesso à Internet, no dormitório dos filhos. Nesse caso não haverá nenhum, absolutamente nenhum controle do uso, tanto no conteúdo quanto no tempo. Depois os pais ficam preocupados com o baixo rendimento escolar dos filhos – pudera, eles passam boa parte da noite jogando jogos eletrônicos, muitas vezes pela Internet! Vão para a escola na manhã seguinte feitos zumbis, e não conseguirão prestar atenção nas aulas. Fora toda a excitação da TV ou dos jogos a que ficaram sujeitos durante horas no dia ou na noite anterior, e lá na frente há um chato de um professor falando calma e longamente sobre algum assunto que não provoca excitação nenhuma... Hoje em dia,  se o professor não der um verdadeiro show na aula (o que o levaria à exaustão depois de uma ou duas), os alunos não conseguirão ser atraídos para o que ele está ensinando. Além disso, educação não é um show, é uma coisa que deve ser parcialmente séria. De quem é a culpa por essa situação escolar calamitosa? Dos pais e dos professores, estes útlimos incentivando o uso de TV e da Internet – eles não percebem que estão comentendo um suicídio profissional! Muitas pessoas dizem: "Se as crianças e adolescentes não usarem os aparelhos em casa, usarão na casa dos vizinhos!" Acontece que o uso será muitíssimo menor nesse caso. Além disso, o conteúdo desses aparelhos chegou a tal ponto de exagero e de grosseria, que uma mãe pode perfeitamente pedir à outra que convidou o filha da primeira, para não deixá-lo ver TV, usar video games e a Internet. Um dos maiores problemas educacionais de hoje é que os pais não estão impondo limites aos filhos, o que em geral faz com que os últimos tiranizem os primeiros, desenvolvendo grandes problemas mais tarde. Impor limites ao uso do computador e da Internet é a coisa mais simples que há: basta não fornecer aos filhos as senhas de acesso aos aparelhos. As crianças e adolescentes têm que se acostumar com a idéia de que há certas coisas que eles não devem fazer, e que seus pais podem ter opiniões diferentes de outros pais, que deixam seus filhos serem prejudicados pelos meios eletrônicos. Isso ajuda-los-á a desenvolverem uma individualidade própria, em lugar da massificação existente hoje em dia.

Qual a sua opinião sobre a inclusão digital?
Já está provado por estudos estatísticos que a inclusão digital aumenta os desníveis sócio-culturais, pois as pessoas que têm cultura usam muito melhor o computador e a Internet, isto é, para coisas mais úteis. É um fato que pais com mais cultura ajudam os seus filhos em sua educação e em seus trabalhos escolares; uma pessoa sem escolaridade não pode ajudar em nada seus filhos no estudo escolar. Isso aplica-se obviamente ao uso do computador e da Internet. Pessoas sem cultura usam-nos para coisas inúteis do ponto de vista cultural. Um artigo na revista Scientific American mostrou, a partir de estudos no Brasil e na Índia, que quiosques com livre acesso a computadores e à Internet não funcionam – as crianças e adolescentes só brincam com eles, e os adultos sem cultura não sabem o que fazer de útil com os equipamentos. A única coisa que funciona na inclusão digital para camadas menos favorecidas economicamente e portanto com menos cultura são salas com computadores, onde há permanente orientaçao de um instrutor, para mostrar e ensinar aos adultos o que eles podem obter de informações úteis, e controlar as crianças e adolescentes para que não fiquem jogando joguinhos ou fazendo chats inconvenientes.

Gostaria ainda de acrescentar o seguinte, fora das perguntas. Certamente é claro para todas as pessoas que a sociedade e a natureza estão em geral piorando (apesar de haver alguns avanços muito positivos na humanidade, como os movimentos ecológico, pelos direitos humanos e pela paz mundial).  Só há uma maneira de revertermos esse processo catastrófico: mudarmos de mentalidade e de ações. Parece-me que uma mudança essencial seria no uso dos meios eletrônicos. Por exemplo, se programas violentos deixassem de ser transmitidos pela TV e fossem eliminados todos os video games violentos, haveria garantidamente uma enorme diminuição na criminalidade e nos acidentes, e haveria uma substancial melhoria na sociabilidade. Se os pais querem criar filhos sem que tenham grandes problemas com eles mais tarde, impeçam-nos de usar os meios eletrônicos.


“Sabe o que significa uma criança pegar uma cadeira e sair brincando de barquinho, de casinha ou de castelo? Uma das coisas garantidas que a televisão e o video game fazem é acabar com a imaginação...”