MAE 116

Noções de Estatística

Probabilidade

Prof. Adilson Simonis

 

1. Introdução:

O primeiro estudo sistemático de como calcular probabilidades apareceu no livro Liber de Ludo Aleae, publicado em 1663, pelo médico italiano ( e também matemático, físico e astrólogo ) Girolamo
Cardano ( 1501 - 1576 ).

Devido a sua fama na época, Cardano foi convidado para fazer o horóscopo de Eduardo VI. Prognosticou-lhe longa vida. O rei morreu no ano seguinte. Por outro lado Cardano previu o dia exato de sua morte e acertou. Muitos dizem que cometeu suicídio para tornar realidade esta previsão.

O conhecimento de como calcular probabilidades circulou entre matemáticos tais como Galileu ( 1564 - 1642 ) e depois passou da Itália para a França com Fermat e Pascal.
 
Em 1654 Fermat e Pascal trocam correspondências sobre o problema dos pontos: Dois jogadores, aos quais faltam a e b pontos, respectivamente, decidem interromper o jogo. Como as apostas devem ser divididas?

solução de Pascal pode ser  exemplificada da seguinte maneira: Suponha que o primeiro jogador a obter 3 pontos vence a aposta em que cada um colocou 32 moedas de ouro.

Suponhamos que o primeiro já tenha vencido duas partidas e o segundo apenas uma. Como na partida seguinte o jogador A pode vir a vencer ( ganhando todas as 64 moedas ) ou perder ( ficando ambos empatados ), A dirá: Estou seguro de receber 32 moedas caso seja derrotado na próxima, mas posso vir a ganhar e como as nossas chances são as mesmas, vamos dividir as 32 restantes. Portanto parando agora, levo 48 ( = 32 + 16 ) moedas e você 16.

Na situação em que o primeiro tenha ganho duas partidas e o outro nenhuma, o raciocínio acima levaria à seguinte conclusão: Caso o jogador A vença a próxima partida leva 64 moedas, e na hipótese de perder, temos a situação anterior, levando portanto 48 moedas. Desta forma A dirá: 48 estão asseguradas e portanto dividimos as restantes 16 moedas, isto é, levo 56 ( = 48 + 8 ) moedas ...

Na situação em que o jogador A venceu uma partida e o jogador B nenhuma, este raciocínio levaria o oponente A a ficar com 44 moedas ! ( se perder faz juz a 32, mas se ganhar faz juz a 56. Portanto, 32 asseguradas e divide 24 ( = 56-32 ) ao meio, isto é 12 + 32 = 44 ).

Pascal prossegue neste raciocínio e o estende para situações mais complicadas, bem como para o caso de jogadores com habilidades distintas, e portanto com chances desiguais. Sua solução faz uso do famoso triângulo de Pascal.

Fermat procedeu de outra maneira. Numa carta a Pascal desenvolve seu método, que repousa em considerações sobre a análise combinatória. Vamos exemplificar: Suponha que o jogador A venceu uma partida e o jogador B nenhuma. Após quatro partidas o jogo estará fatalmente encerrado, pois um dos dois oponentes terá os três pontos necessários.
Indicando por a uma partida vencida por A e por b a partida vencida por B, teríamos as seguinte possíveis situações:
 

1-  a aaaa    9-  a baaa 
2-  a aaab  10-a baab 
3-  a aaba  11-a baba 
4-  a aabb  12-a babb
5-  a abaa  13-a bbaa 
6-  a abab 14-a bbab 
7-  a abba  15-a bbba 
8-  a abbb  16-a bbbb 
 

Neste caso existem 11 favoráveis para o jogador A e 5 para o jogador B do total de 16 possíveis. ( Note que 11 ¸ 16 =  0,6875 , e que 0,6875 X 64 = 44 moedas ). ( Ou que 20 ¸ 44  = 5 ¸ 11 ).

Portanto as duas soluções ( Pascal e Fermat ) são as mesmas.

Este problema interessou a Huygens ( 1629 - 1695 ) que iniciou o estudo propriamente dito da Teoria das Probabilidades e incentivou Jacques Bernoulli ( 1654 - 1705 ) a publicar o Teorema Central do
Limite ( Teorema de Ouro ).

Não é muito freqüênte o fato de um filho herdar do pai um talento fora do comum, mas mais estranho é o aparecimento de uma dinastia de sábios, que ocuparam um lugar de destaque na história da ciência.

Este é o caso da família dos Bernoulli. 


 
Um grande matemático ( Leibnitz ) em uma carta a João I Bernoulli chegou a criar um verbo para se referir a ocupação matemática dos membros desta estirpe : Alegra-me saber que teu filho bernoulliza, mantendo assim a  tradição da família.

Neste período, Montmort ( 1678 - 1719 ) e De Moivre ( 1667 - 1754 ) deram fortes contribuições, mas é com Pierre Simon, Marquês de Laplace ( 1749 - 1827 ), que um grande número de idéias e resultados são introduzidos.

Suas idéias dominaram durante todo o século 19. Rapidamente as idéias foram sendo aplicadas em áreas tais como finanças públicas, seguros e diversas áreas sociais.

A partir da metade do século 19, gradualmente se tornaram parte da teoria física, primeiramente nos estudos da teoria de transferência de calor e depois com Maxwell que utilizou o cálculo de probabilidade em 1860 para deduzir a lei dos gases a partir da posição e das velocidades das moléculas.

Boltzmann em 1877 utilizou a idéia de distribuição de probabilidade de energias das moléculas para interpretar a questão de irreversibilidade na Termodinâmica.

O surgimento da mecânica quântica apoiada pela teoria da radiação colocada sobre bases probabilísticas
por Max Plack em 1900 permitiu que a probabilidade invadisse a teoria atômica e seus conceitos
se tornassem fundamentais para a ciência moderna.

Neste período, início do século 20, principalmente as contribuições de matemáticos russos, permitiram a formalização assim como o avanço no estudo da Teoria da Probabilidade, em particular do problema central do limite e das cadeias de Markov. Considerações sobre os fundamentos, aplicações à economia e sociologia foram feitos por Bertrand Russel, Keynes e Pareto,  respectivamente.

A conexão estreita entre matemática e a probabilidade foi iniciada por Emile Borel, sua ligação com teoria dos jogos sedimentada por Von Neumann em 1928 e assim por diante...
 
2. Probabilidade: Definição e propriedades.
 
A Teoria da Probabilidade tenta dar significado a experimentos tais que o resultado não pode ser
completamente pré-determinado. Se você for privado de ar durante um grande período de tempo, ou aquecer a água acima de 100 graus Celsius, certamente preveremos o resultado. Se você lançar uma moeda, ou um dado, qual face cairá?

Calcular a probabilidade é medir a incerteza ou associar um grau de confiança aos resultados possíveis. Por exemplo, escolha uma carta qualquer em um baralho comum depois de ter sido bem embaralhado
( isto é, ao acaso ). O que é mais provável, sair uma figura ( R, D, J ) ou sair o dois de paus?

Essas medidas, as probabilidades, associam às possíveis combinações dos resultados, que chamamos de eventos, um valor entre 0 e 1. Quanto maior o valor, maior a certeza de sua possibilidade de ocorrência.

Por exemplo, sair uma face par no lançamento de um dado, ou uma carta de ouros em um baralho,
são eventos, isto é, subconjuntos do conjunto que contém todos os resultados possíveis do experimento aleatório  ( ALEA = Dado ). Denotamos por S tal conjunto, e chamamos de espaço amostral.
 
EXEMPLO:  Considere o experimento aleatório que consiste no lançamento de um dado. Então S pode ser escrito como S = { 1, 2, 3, 4, 5, 6 } e alguns possíveis  eventos poderiam ser:
A = { face par }  = { 2,4 ,6 }
B = { face maior ou igual a 5 } = { 5, 6 }
C = { face maior ou igual a 7 } = Æ = conjunto vazio

DEFINIÇÃO: Se dois eventos quaisquer têm intersecção vazia, isto é, eles não podem ocorrer simultaneamente, dizemos que eles são mutuamente exclusivos.
 
Existem várias maneiras de definir a probabilidade de um evento. A mais adotada nos primeiros cursos é aquela baseada em eventos equiprováveis . Qual a chance de ocorrer cara ao lançar a moeda que tenho
no meu bolso?

DEFINIÇÃO: Dado um evento A associado a um experimento aleatório com espaço amostral S equiprovável, a probabilidade do evento A, denotada por P ( A ) é o quociente :

P ( A ) =  # A  ¸ # S

Isto é, número de resultados favoráveis ( ao evento A ) dividido pelo número de resultados possíveis.
 
PROPRIEDADES:  Para qualquer evento A,

1.  0 £ P ( A ) £ 1

2. P ( Æ ) = 0 e P ( S ) = 1

3.  A probabilidade da união de eventos mutuamente exclusivos, ou disjuntos, é a soma de suas probabilidades.
 
4. P ( A È B ) = P ( A ) + P ( B ) -  P ( A Ç B )

5. P ( Ac ) = 1 - P ( A )
Ac = A complementar = Não A

Exemplo: Lance dois dados, Qual a probabilidade de ocorrer a soma das faces igual a sete ?
 
S = { (1,1), (1,2), ..., (6,6) }

A = { (1,6), (2,5), ..., (6,1)}  

# A = 6

# S = 36

P ( A ) = 6 ¸ 36
 

Observe que no exemplo anterior, você adotando S = { 2, 3, ..., 12 } e A = { 7 } você poderia vir
a pensar que P ( A ) = 1 ¸ 11. O erro está que neste caso o S não é equiprovável...

Definição: A e B eventos, com P ( B ) ¹ 0. Definimos a probabilidade condicional de A dado B por :

P ( A / B ) = P ( A Ç B ) ¸ P ( B )

Definição: A e B são eventos independentes se P ( A / B ) = P ( A )
Isto é, P ( A Ç B ) = P ( A ) X P ( B ), onde A Ç B = intersecção.

Exemplo: Qual a probabilidade de sair soma sete no exemplo anterior, sabendo-se que saiu
uma face 4 ? Resposta: 2 ¸ 11

A primeira face é 3 e a soma é sete são independentes: 1¸ 6 X 1¸ 6 = 1¸ 36

As duas faces são pares e a soma é sete, não são independentes: 9¸ 36 X 1¸ 6 ¹ 0